outubro 21, 2005

“A vida é uma escolha de histórias"


Uma balsa derivando, uma hiena chorando, uma zebra riscada de perna partida, um orangotango e Richard Parker, um tigre de Bengala. Ou “A vida de Pi”, adolescente indiano cujo trajecto se cruza com o destes animais, cuja sobrevivência se recolhe no seio de um oceano, cujo destino se assimila, enraizado por um passado comum.
Yann Martel desenhador da obra, nascido do mundo por onde caminha, retracta, costurando linhas em capítulos de palavras, ao sabor de um rumar que escolheu sem conhecer, “é para mim um mistério ser hoje, escritor”.

Yann Martel ou um canadiano nascido em Salamanca, mas com somente três dias migrante, para Coimbra onde cresceria durante três meses, abandonando depois a velha Europa. Filho de diplomatas chegaria a adulto nas Américas, mas o mundo para lá dos oceanos, que lhe serve o cenário da sua obra, fascinava-o, fascina-o, “a Índia é como ter toda a vida num só sitio, onde todas as histórias ainda são possíveis”.

Depois de licenciado no Canadá, trabalhou, perto das palavras mas “à noite”. Todavia durante o dia era segurança em Paris, ou mais tarde empregado de restaurante.

Com três livros editados, “Facts Behind the Helsinki Roccamatios” em 1993 e “Self” em 1996, “A Vida de Pi”, o seu mais recente romance, cujo lançamento ocorreu no dia 11 de Setembro de 2001, foi no ano transacto galardoado com o Booker Prize, o prémio literário de maior grandiosidade na Commonwealth.

“Tudo começo há treze anos atrás, quando li um artigo no New York Times acerca de um romance brasileiro em que parte da história tinha lugar num salva vidas, onde estavam um homem e um animal selvagem, no entanto esqueci-me, mas passados sete anos estive na Índia e começaram a surgir-me ideias, e em menos de uma hora toda a estrutura da obra estava na minha cabeça”, explicando assim o momento da edificação, do nascimento do romance, “a vida é uma escolha de histórias”, afirma.

A disparidade social, fruto da diferença e da multiculturalidade do planeta são conceitos espelhados nas linhas que escreveu, que marcam também distinta presença no discurso que vai construindo, “quando olhamos sociedades como a canadiana, a portuguesa, tudo parece racional, ordeiro, organizado, mas a Índia é diferente, há muitas injustiças, mas quando se vai lá, atinge-se a percepção de que se tem estado a perder qualquer coisa da vida e ela ganha com isso, um novo sentido”.

“Todo o artista que é ambicioso deseja a certa altura o reconhecimento, as vendas, os prémios, que são importantes pois trazem as atenções para uma obra, mas contudo injustos porque as desviam de outras igualmente boas”, refere o escritor, para quem a escrita, a criação de algo apenas com palavras é “um fascínio e simultaneamente um misto ilusão e lucidez”. Aos escritores ainda desconhecidos se dirige a seguir, “leiam muito, principalmente os clássicos, os russos, anglo-saxónicos como Hemingway ou Kafka, tentando manter-se afastados dos sistemas”, pois, explica, “a escolav universitária mata a livre escrita e a maioria dos escritores não possui um educação formal, escrevem porque se não o fizerem...morrem”

De Portugal conta, “o primeiro sítio para onde viajei sozinho, e local que irá servir de palco no meu próximo romance”, conhece o fado de Amália mas também Saramago, Lobo Antunes, Miguel Torga, Pessoa e Luís de Camões, mas a sua visão acerca da lusitânia aprofunda-se para além das obras culturais, “aqui há africanos, indianos, brasileiros, timorenses, há um pouco de muitas culturas na vossa própria cultura, o que transporta a sociedade para uma diversidade verdadeiramente interessante, enriquecedora culturalmente”.

Por,
Pedro Cativelos

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