“Sing me something new”, ou o desvelado livro de memórias de uma vida feita de momentos recrutados pela nostalgia, resguardados por entre melodias ecoadas dos idos de oitenta.
David Fonseca reaparece no panorama musical português com “Sing me something new”, todavia agora desacompanhado dos Silence 4, “ simplesmente porque o excesso em que vivíamos, conduziu à perda da verdadeira razão das coisas, o que nos fez resolver parar por uns tempos”.
O berço do novo álbum do cantor leiriense, é a sua casa, onde depois de “um ano em que apaguei a música da minha vida, se iniciou todo o processo de composição” sob a égide da livre e despreocupada criação, “ resolvi fazer música para mim, e acabei por, passados alguns dias estar a gravar algo que é um fruto das minhas divagações, e que pura e simplesmente não foi sujeito a qualquer tipo de condicionalismo”, considerando-o inclusivamente como o “mais livre” dos três álbuns que já editou.
A diferença em relação aos seus anteriores trabalhos está de resto patenteada no processo utilizado na construção de cada trecho musical, “ neste disco toco quase todos os instrumentos, o que transforma radicalmente o resultado final, pois quando uma pessoa faz um tema e o interpreta instrumentalmente de variadas formas, a intenção não se dissipa, mas pelo contrário concentra-se, e ganha uma forma mais próxima do originalmente imaginado”.
A vertente intimista apresentada em “Sing me something new” , transporta consigo a visão pessoal e a face mais interior da personalidade do cantor português, que não deixa de confessar o seu fascínio pelo mundo e pelas pessoas, “aquilo que mais me influencia é a vida quotidiana, a vida comum das coisas, de mim e dos outros que me rodeiam”, anuindo ser esse o mais essencial dos motivos que o “desperta para a composição, que para mim se constitui como uma espécie de fotografia”.
A impossibilidade real de pausar o mero segundo que passou, em direcção à recordação, não é para David Fonseca, contudo irrealizável, “tento concentrar esses momentos, estancando-os num disco, para sempre”.
De um passado distante a um passado quase presente, poderá ser, de um ponto de vista metafórico, a mais clara e correcta forma descritiva da marcha de cada uma das faixas de um álbum no qual são marcantes as alegóricas referências aos anos oitenta, bem como a bandas como os Pixies ou os The Clash, “no fundo é o recordar de músicas que ouvi em criança, e me fizeram descobrir a vontade de também eu, fazer música”.
Por,
Pedro Cativelos, 2003
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