Como plasticina colorida, os versos nascidos na mente do vocalista Sebastião Antunes, são moldados por instrumentos do mundo, étnicos na sua essência, dando côr à vontade expressa pela Quadrilha no seu mais recente trabalho discográfico. Síntese desta ideia, “A Côr da Vontade”, editada em álbum no passado mês de Outubro, fundamenta as suas razões pela verbalização de ideais interventivos. “Não dêem cabo do mundo”, ou “À força não hei-de ir”, são exemplos de canções recheadas de sobreavisos de relevância social, que circundam em redor de ideias chave, desmistificadas pelo uso exacerbado que delas é feito em tantos e tantos locais da sociedade da comunicação, mas que no caso particular surgem reconstruídas, e redireccionadas por uma perspectiva diferente.
Após a gravação de quatro álbuns, Sebastião Antunes revela a coloração da vontade que levou a Quadrilha a desenhar este quinto disco, com os traços com que o fez. “Ser músico... fazer música é um acto cuidado de composição, que após estar completo, pelo menos fisicamente, pertence a todos. A isso chama-se partilha, e isso, é tudo ”, explica o compositor, exalando nas palavras, “a alegria de sentir o álbum nas minhas mãos”, e acabando por fazer uma revelação. “De todos os discos da Quadrilha, este foi o que mais alegria me deu, pois derivou de uma meia-ruptura, de um recomeço, em relação ao trabalho que a banda vinha desenvolvendo, e também por convidados como Janita Salomé ou o grupo Segue-me à Capela”, deixa expresso.
A noção sensorial de simplicidade, que transborda dos pensamentos ao ouvir as melodias tocadas pela Quadrilha, é um tema abordado por Sebastião, “a música tal como a cultura, deve ser abordada e exposta de forma simples, pois cultura é a representação da arte secular de um povo, e não só como muitas vezes se quer fazer parecer, um abranger de pensamentos filosóficos sobre este ou aquele assunto”. Exemplo dessa forma de encarar a arte de criar sons, constituídos por palavras e instrumentalidades provindas de flautas andinas, congas árabes, o aborígene didjeridu, ou as já anteriormente utilizadas percussões celtas, indiciadores de uma noção de folia tão familiarmente próxima da Quadrilha, “a forma como o público, no início mais rural, agora mais jovem, mais urbano, dança e se diverte nos concertos”, consequência que atribui “a uma renovação que desenvolvemos... começámos por ser mais tradicionais, mas agora misturámos tudo, desde a música celta, às ambiências norte-africanas”. Algo com que travou conhecimento, “durante um período de quatro anos em que a banda estava parada, em que viajei, fiz recolhas, gravei coisas... assim conheci alguns músicos que tocam agora comigo, e isso influenciou-me ao fazer música”, conta.
A impressão das linhas ostentadoras de uma qualquer etnia, na sua composição musical, constitui-se aliás como uma das suas mais apelativas sensações. “A música do mundo está na moda. O conceito em si não significa mais do que um tipo de sonoridade próprio de uma etnia, consignado a uma determinada região”. Todavia, “estudo etno-musicologia, e encarando-a como uma ciência, é para mim uma infindável fonte de prazer”.
A miscigenação das palavras, cantadas, encantadas por histórias de mitos e misticismos, e a plural exposição dos sons, resulta como uma das indeléveis demarcações pautadas nas composições da Quadrilha, e da sua voz principal. De duendes, gnomos e papões, se fala a seguir. “Gosto particularmente das crenças antigas, da utilização do imaginário histórico-fantástico que emana da tradição própria de cada cultura. Em Portugal penso que deixámos esquecer a nossa mitologia infantil, toda a onecada que nos povoa os sonhos, e que tem um papel importante na nossa própria formação enquanto crianças”.
Por,
Pedro Cativelos
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