dezembro 20, 2005

Alive and Kicking



Jim Kerr, highlander vocalista compositor dos Simple Minds, filhos dos 70´s, progenitores dos 80´s, em conjunto com os U2, Duran Duran, Tears For Fears, Depeche Mode e alguns outros, mas também intérprete dos seus problemas, das suas dúvidas, sobrevivendo de prazeres simples, numa história que já toca quase os trinta anos.
Por entre as sombras, por entre as luzes deste Black and white 050505, é fácil reconhecê-los, afinal porque ninguém se esqueceu deles!

Já viveu em Portugal, agora, escolhe a Sicília para lar, e para laboratório de um regresso às origens…

É verdade sim, vivi em Portugal durante algum tempo, no Algarve, em Monchique, uma localidade aliás lindíssima, que me trazia calma, e paz.

Depois descobri a Sicília, que não é assim tão diferente… Não sei ao certo onde está a minha verdadeira casa! Acho que esse sentimento tem por objectivo sobreviver dentro do nosso coração, e nunca de lá sai. É até irónico que Sicília faça parte do retorno aos palcos da música!

Porquê irónico?

Pelo repouso, pelos sentimentos que me traz, pelo conforto que me oferece, pela sensação de acolhimento tão idêntica à que sinto que na minha Escócia, tão fria e chuvosa. A aparente contradição advém disto mesmo. Toda esta harmonia influencia-me a escrita, os pensamentos, fundindo-os com o meu mais profundo Eu, e acaba por me conduzir de novo à estrada com os meus companheiros, e a uma vida que já não esperava.

Mente simples, em corpo são…

Pode-se dizer isso, sim… Todos os dias me levanto bem cedo, por volta das 6 horas, tomo o meu café, e um bom pequeno-almoço, e sento-me a escrever, a compor. Até ao final da manhã faço apenas isto. Depois sei lá… vou para a praia, vou jogar à bola com os meus amigos, vou passear, conhecer tanto que ainda não conheço! Tenho 50 anos, não fumo, não bebo, mesmo sendo escocês! , e sempre que acordo sinto uma energia enorme em saborear um dia mais, em alimentar a minha alma o melhor que conseguir.

Pode ser este considerado um capítulo, ou melhor, uma estação de uma longa viagem que iniciou ainda jovem?

Só o poderei dizer se um dia virar a página, ou prosseguir para outro destino, mas agora não penso nisso.

Mas sempre foi um viajante…

Sempre fui bastante agitado. Eu e o Charlie Burchill (guitarrista e compositor) fomos à boleia quando tínhamos aí uns 16 anos, e acabámos por conhecer toda a Europa. Nesse tempo a vida em Glasgow era miseravelmente dura, cinzenta. Felizmente que agora atravessa um renascimento, uma nova fase! Mas voltando um pouco atrás, este trajecto, ainda bastante cedo na minha existência, ensinar-me-ia a observar o mundo, ou uma parte importante dele, de uma outra forma, de perceber a pequenez de uma ilha, de um continente, e construir a percepção de conjunto, por oposição à ideia de isolamento social, cultural e humano.

Quando se conhece uma língua diferente, todo o seu universo, a nossa mentalidade altera-se para sempre…

Dos roteiros sem destino, ao regresso às partituras em folhas de papel canção…

Muitas vezes um tema nasce de algo tão pequeno! É curiosa, e muito misteriosa essa evolução, sabe?! Existe por vezes uma tal concentração de ideias, que se torna essencial o respeito pelo espaço, para que a mensagem não se esbata. È importante o contraste, as sombras e as luzes, essa relação, esse equilíbrio é essencial.

Black and White 050505, é um regressar a esse jogo de equilíbrios…

Mais que um desafio é um reanimar, um reavivar de velhos fantasmas… Queremos provar neste trabalho que podemos fazer um pouco de tudo, encarnando várias facetas, umas mais intimistas, outras mais vastas, no fundo reactivar a nossa expressão de banda de clube.

Um renascimento também pessoal?

Houve períodos em que me distanciei da música, em que estava cansado, muito mesmo. Estive 4 anos sem criar nada, sem sequer sentir falta disso, creio eu…

Até que…

Um amigo, me desfia para tocar algumas coisas para ele, e acabo por reencontrar a música. Sabe que quando se faz uma coisa durante tanto tempo, deixa de ser profissão ou carreira, ou mesmo dinheiro, e passa a ser uma forma de vida. Não poderia ter outra. Não seria eu de outra forma.

O último impulso estava assim dado?

Depois peguei no telefone falei com eles, juntámo-nos e tudo começou outra vez! Queríamos no entanto fazer um álbum com um som contemporâneo, mas onde se pudessem reconhecer as maiores marcas dos Simple Minds.

Parece reflectir-se na composição deste novo álbum, a inconstância da vida, dos altos e baixos que todos atravessam... É difícil encarar a mudança, como pessoa, tanto quanto banda?

Não há manuais, apenas o instinto, que saindo um pouco do âmbito da música todos possuímos, e utilizamos para lidar com as situações difíceis que a vida nos coloca. Como conjunto de músicos, já tocámos para milhares de pessoas, para estádios cheios, mas isso não pode afectar a nossa disposição actual. Considero uma sorte poder fazer o que faço, há muita gente que não pode viver o seu sonho, concretizá-lo.
Acima de tudo sou pragmático, tento viver cada momento no palco como se ele fosse essencial para cada pessoa que está lá do outro lado, e gosto de pensar que consigo transmitir algo a quem me está a ver, nem que seja só uma pessoa!

Pode o sucesso actual de bandas contemporâneas dos Simple Minds, como o são os U2, os New Order ou os Depeche Mode ser inspiradores?

Sim, e vejo-o em tantos outros casos, como Bob Dylan, Neil Young, Lou Reed ou David Bowie, que além de serem referências para as pessoas o são também para as editoras.

Como observa o mercado musical de hoje, em comparação com o de há quase trinta anos, quando abandonaram os pubs de Glasgow, partindo para os discos de vinil?

Quando o showbusiness nos entra pela porta, quer-me você dizer?! A minha atitude mantém-se a mesma, desde esses tempos. Continuo a querer fazer o que então fazia, com a mesma humildade, com a mesma dignidade. Continuo a querer ser brilhante!

E a primeira digressão em tantos anos?

Temos ainda um dos primeiros espectáculos pré-tournée digamos assim, aqui em Portugal, (no Outlet de Alcochete) que espero que corra bem. Depois estaremos parados e só em Janeiro partimos de facto para a estrada. Como me sinto? Normalmente estou em melhor condição no final do que no início, é tudo uma questão de ritmo. Mais que tudo estamos muito entusiasmados por poder de novo viajar juntos, de levar os nossos velhos clássicos, assim como as nossas novas ideias, aos públicos que existem por esse mundo fora.


As Faixas de Black and White 050505
Recordando os ecos do clássico “New Gold Dream (81-82-83-84)”, a sugestão do nome do mais recente trabalho dos Simple Minds tem precisa relação com o último dia de gravações.


Stay Visible

Sobreviver

Home

O primeiro single. Foi escrita na Sicília, um dos locais que me faz regressar, não sei bem ao quê, nem aonde, mas que me faz sentir humano.

Strangers

Creio que é uma metáfora, caracterizadora daquilo que sentimos quando queremos afirmar uma posição, mas não conseguimos ultrapassar o nosso próprio medo.

Different World

Numa dinâmica global em que impera a mediatização e os seus efeitos, a evocação dos mundos que ainda existem, como espelho, dentro de nós próprios.

Underneath the Ice

Quando sabemos, mas receamos. Quando devemos, mas sem perceber porquê, não concretizamos.

The Jeweller, Part 2

O processo miraculoso que conjuga a realidade, tornando-a fantasia.

A life shoot´in Black & White

Representa o início de toda uma nova fase, pois foi a primeira música que idealizei após um período em que estive longe da música.

Kiss the Ground

A proximidade, a intimidade que considero essencial, entre o Homem e a Terra.

Dolphins

Imagino-os como um ser carinhoso, amigável e pacificador. A canção fala de um homem que se sente desligado de tudo, esquecido, ou perdido, nas profundezas da vida, mas que encontra esperança, quando observa este maravilhoso ser emergir das águas escuras.


Pedro Cativelos, Outubro de 2005