outubro 12, 2009

Volta ao Mundo: Escócia, no Coração das Highlands.

Whisky, gaitas de foles, golfe, castelos de pedra desgastada pelos milénios e lagos que reflectem a paisagem escarpada, resguardam em si lendas milenares de encantar a vista, e arrebatar o espírito, relembrando constantemente que quem visita as terras altas da Escócia regressa sempre diferente.



Texto
Pedro Cativelos
Fotografia
Joaquim Gromicho


“Aqui é a Escócia, não somos ingleses, somos highlanders”. O ar trocista, folgazão, arruivado serve de estereótipo, a frase também. A primeira lição de quem chega ao território dos homens das montanhas está aprendida, e apreendida. De facto o ar é leve, as colinas elevam-se aos céus, os lagos tornam-se mais profundos, assim como os olhares o são, as conversas se tornam, os elos se mantêm. A história bem o ensinou a este povo sofrido que nunca conseguiu escapar às batalhas que travou ao longo dos séculos, na busca eterna da própria existência, dos combatentes pela independência como William Wallace ou Robert de Bruce, dos que professaram a paz nas palavras da poesia, como Robert Burns, da religião ao desporto, das mais altas montanhas do norte, aos mais planos vales do sul, tudo se mistura um pouco, numa amálgama de influências sempre sofridas na pele cultural de um povo que tem tudo para oferecer, que não revira os olhos quando partilha, não se envergonha quando se revela.

O tráfico é adverso por aqui. Não que as más maneiras se alheiem dos bons costumes britânicos, nada que se pareça. Adverso porque simplesmente funciona tudo ao contrário. A esquerda e a direita confundem-se, inquietam-se, pelo menos durante as primeiras horas, até as vistas se habituarem, e os trejeitos de condutor dominarem os reflexos adquiridos. A calma, essa, abate-se passados minutos de pisarmos a terra escocesa, quando se atravessa no horizonte o primeiro de uma infinidade de “Loch´s” majestáticos, rendilhados de verde e águas geladas, apesar da maior onda de calor dos últimos largos anos. “Quinze graus”, exclamam. E é mesmo verdade, parece que se está nos trópicos, a avaliar pela quantidade de manchas de suor nas camisas de quem regressa do trabalho, e nos calções de praia (que nunca terão avistado um grão de areia de uma praia escocesa, talvez de Albufeira destino privilegiado pelos escoceses) dos que se passeiam em férias. Mas não passa do primeiro aguaceiro a ténue ideia de tropicalidade, que as nuvens que ocultam o sol constantemente já deixavam desconfiada.
No Parque Nacional de Loch Lomond, reside o maior lago de água doce da velha Bretanha, e um dos mais procurados, bem procurados diga-se, onde são habitualmente avistadas estrelas como Clint Eastwood, Luciano Pavarotti e Michael Jackson. Quando se chega ao Cameron House, um hotel de cinco estrelas erigido na planta de um castelo do século XVII, imponente sobre as águas, com quase cem quartos elegantemente decorados, piscina, ginásio, sauna, solário, salão de beleza e cabeleireiro, massagens, jacuzzi, Spa e campo de golfe nos arredores, percebe-se o porquê de tão “celebrizadas” escolhas.
Calma, serenidade, ausência de ruído, para lá do grasnar dos cisnes selvagens, e do suave chocalhar das águas abstenhas de ondulação, que se movem apenas ao sabor da brisa ténue do entardecer.
Torna-se no entanto impossível vaguear por aqui, sem que a estridência sonora das gaitas de foles ecoem na imaginação, ao som da voz profunda de Sean Connery, que se reconhece em todas as sílabas do acentuado sotaque da pronúncia escocesa. “É uma maravilha não é?!”. Interrompe-se o silêncio, na figura de um jovem com o traje padronizado da antiga Escócia. Russel Davies, empregado do hotel, trabalha aqui há meio ano. Deixou o mercado da publicidade porque “a crise está por todo o lado, até aqui, nas highlands”, humoriza. “Além disso ganha-se bem na hotelaria, o turismo é a nossa principal e quase única riqueza, devido à natureza e história que temos, pena é o clima não é?!”. Talvez, mas um pouco de variedade nunca fez mal a ninguém, pelo menos na óptica do visitante turista ocasional. “Desde que não chova mais do que umas cinco ou seis vezes ao dia, já é Verão”.


Raízes perdidas… e achadas
Com uma população a rondar os cinco milhões de pessoas, que se dividem na sua maioria entre as grandes cidades como Glasgow, Aberdeen, Inverness e Edimburgo (a capital), a actividade económica do país é sustentada primordialmente pela agricultura, pela pecuária, pelas exportações de whisky e por todos os serviços relacionados com o turismo. Banhada pelo Mar do Norte e pelo Atlântico, do seu território fazem parte quase oitocentas pequenas ilhas, muitas delas em estado completamente selvagem.
Definitivamente ligada a Inglaterra desde o primeiro de Maio de 1707, quando depois de séculos de guerra e guerrilhas com a coroa inglesa em busca da soberania da independência, formalizou então uma união política com o Reino da Inglaterra, que viria a estar na origem do novo, então, Reino Unido da Grã-Bretanha. Mas não estava ainda garantida, longe disso, a paz tão desejada, e muitos tumultos sociais se seguiriam nos séculos vindouros.
A Escócia continua a ser no entanto uma nação com jurisdição e Parlamento separados do Governo central, o que se reflecte nos sistemas de direito e de educação escoceses, onde se ensina ainda (chegou a ser banida mas tem vindo a ser recuperada gradualmente) a língua gaélica, o étimo original falado na região, desde o século V, quando os celtas provenientes do norte da Irlanda assentaram na costa ocidental, levando uma variedade do gaélico.
Se com a língua, parte da originária cultura céltica se foi diluindo, o mesmo aconteceu com todas as outras manifestações culturais que tornam a Escócia única, e famosa no mundo. As gaitas-de-foles, o Glengarry (chapéu típico utilizado pelos mais velhos) ou o uso do Kilt, que surgiu no século XVI, no norte da Escócia, onde cada clã ou família utilizava um tipo de quadriculado que identificava os seus integrantes, foram manifestações culturais que chegaram mesmo a estar praticamente erradicadas, devido ao jugo imposto pela corte Inglesa durante muitos séculos. Só algumas famílias highlanders, no norte do país resistiram, mas com o abrandar da pressão política, as tradições começaram a ressurgir, e a serem orientadas para o turismo.
Não é assim nada pouco usual ver crianças de Kilt a tocar gaita-de-foles, aproveitando as férias escolares para fazer algum dinheiro extra. Em cada castelo, museu, ponto de passagem turístico, lá estão a recriar ambientes através do mais puro dos sons da terra. “Sim, aprendemos na escola, e vimos para aqui fazer render o tempo e aproveitar para exercitar os dedos”, conta o pequeno Eric Macdonald enquanto conta as poucas “pounds” que os turistas lhe deixaram na caixa de madeira que utiliza para transportar o instrumento.



Viajar de carro pela Escócia é um festim para os sentidos…
E a melhor forma de conhecer a verdadeira Escócia. Lá fora a chuva cai torrencial, quase tão depressa como passados minutos se dissipam as nuvens e tudo volta a ser luminoso outra vez. “Landscape”, uma palavra que ganha todo o sentido que nunca lhe tinha encontrado, quando ao virar de uma curva da estrada, se nos depara uma e outra, e outra vez um cenário retirado dos folhetos turísticos. Serenos rebanhos de carneiros a pastar por prados que se estendem até às margens de um lago, que o interrompe apenas até à encosta mais distante, porque a vista em forma de postal, alcança o horizonte.
Outro dos percursos “obrigatórios” para quem pretende oferecer a si próprio um dos mais belos momentos que se podem viver e sentir, foi imortalizado em livro, e em cinema por JK Rowling, a mãe literária de Harry Potter.
A viagem no Jacobite da West Coast Railways, na obra chama-se Hogwarts Express, comboio a vapor do início do século passado que atravessa montes agrestes e vales invadidos de Margaridas selvagens, entre Fort William e Mallaig é uma das atracções turísticas mais procuradas por viajantes de todo o mundo, e que não se poupam a esforços na procura das muitas paisagens que se vão sucedendo para lá das vidraças foscas, da fuligem que esvoaça, quando se dissipa a fumaça do carvão consumido vorazmente.
Passamos Ben Nevis, a maior montanha britânica, famosa pela sua estância de esqui, as profundas águas doce de Loch Morar, depois Loch Nevis, e por fim a estação ferroviária mais ocidental do Continente em Arisaig, numa rota que inclui paragens, marchas lentas, outras mais céleres, sempre ao sabor do pouca-terra, pouca-terra…
Pelos corredores estreitos, de encontrão em encontrão, e com muitos “sorry´s” pelo meio, um casal de texanos “equipados” à Harry Potter parecem querer captar toda a viagem no cartão de memória da sua máquina digital. “Viemos de longe para fazer este passeio com que sempre sonhámos, desde que vimos o filme que de facto e pelo que nos disseram fez com que disparasse o turismo neste trajecto”. Interrompem, para tirar mais uma fotografia, dispersam-se com as seguintes.
Prosseguimos, por Corpach, Glenfinnan, Lochailort, Arisaig, e Mallaig onde se recomenda uma refeição pouco saudável mas totalmente britânica. “Fish and chips?”. Sim claro, “why not?!”.
A gastronomia escocesa é um pouco mais variada que a inglesa mas não corresponde ao protótipo da boa mesa portuguesa, longe disso. A utilização de produtos frescos, as carnes, o salmão, ou os mariscos são o mote para algumas boas refeições, em pubs à beira da estrada, ou em restaurantes situados em unidades hoteleiras luxuosas. No entanto, o prato nacional da Escócia é o calórico Haggis, uma mistura de constituição duvidosa à primeira vista da ementa. Pulmões, coração e fígados de borrego picados e misturados com aveia, servido com acompanhamento de puré de batata, nabo e pimenta preta não auguram nada de pouco indigesto, mas afinal até é uma saborosa novidade. Outro dos pratos típicos é o Scotch Sink, uma sopa de peixe com carne de veado ou faisão.
De regresso a Fort William, e com o apetite disfarçado, a curiosidade aguça-se agora com um pormenor inesperado e uma recordação de casa. A Olton Hall, máquina que puxa as cinco carruagens divididas entre primeira classe onde se servem chá e bolos de manteiga acabados de sair do forno, tem a data de 1937 e foi construída em… Vila do Conde.


Loch Ness. Mito verdadeiro… para o turismo.
“Se já vi o monstro? Vá procurá-lo, mas já agora, não quer beber nada?”. Um sorriso, e um piscar de olho quase que servem de prova científica de que o mito de Nessie não passa disso mesmo. No entanto, em Fort Augustus, pequena vila adjacente ao mais famoso Loch do mundo, atravessada ao meio pelo canal da Caledónia, utilizado hoje unicamente por embarcações de recreio, foi todavia construído em finais do século XIX para permitir às embarcações do Mar do Norte a travessia da Escócia em direcção ao Atlântico evitando assim as más marés, nota-se sobremaneira a sua influência. Depois, três Pubs, um posto de informação para turistas e a maioria das casas de habitação transformadas em Hostels, com tabuletas de madeira com as iniciais de “Bed and Breakfast” gravadas a tinta colorida, para além de alguns hotéis de média dimensão a comporem o cenário. “Temo-nos desenvolvido de forma sustentada com este fenómeno. Não podemos é crescer muito mais porque temos muitas regras que restringem a construção e se começarem a nascer empreendimentos turísticos e arranha-céus, Loch Ness acabou! As pessoas vêm aqui por causa da lenda de Nessie, mas também em busca de algo mais, de uma calma de uma paz interior que têm de encontrar”, conta Ben Jarvis, que trabalha no mais animado dos Pubs da localidade. “Agora, depois de um whisky de malte, vá lá ver se acha ou não a nossa Nessie, garanto-lhe que é mais fácil de a encontrar agora”, volta a insistir, pândego e sorridente. Não haverão no entanto muitas sensações que superem a emoção de olhar o cair o dia, sem anoitecer totalmente (durante o Verão há sempre claridade até ao amanhecer, por volta das três da madrugada) nas margens do mítico lago enquanto se saboreia a verdadeira “água da vida”, de malte como convém, e como lhe chamam por aqui.
Na realidade, a história da serpente marinha, como a denominaram os primeiros cristãos colonizadores no século VI, ou o mais tardio monstro marinho que colocou o Loch Ness no mapa mental de milhares de pessoas em todo o mundo serviu para mobilizar toda uma indústria em seu redor. Há o museu da criatura, em que se pode acompanhar todo o trajecto desde os primeiros “avistamentos”, há os cruzeiros pelo lago, onde através de um sonar se pode acompanhar a mais leve movimentação no leito do rio, obviamente muito procurado pelas centenas de turistas que percorrem ainda as margens com as câmaras de filmar em punho, atentos a qualquer cauda de serpente marinha gigante que possa aparecer inadvertidamente, há a estátua de Nessie, como carinhosamente lhe chamam, retirando-lhe o rótulo monstruoso das histórias contadas para assustar as crianças e as obrigar a comer a sopa, há os porta-chaves e os posters, os calendários e os baralhos de cartas. Nessie é de facto um fenómeno global, de algo em que se acredita, sabendo-se bem no fundo, que pode não ser bem assim. E o contrário também serve, ou pelo menos é a sensação com que se fica, quando se observam as águas negras, e as ondulações oblíquas do lago mais profundo da Escócia. “Vivem segredos nestas águas, profundas como a mente humana, tanto que nela caberiam duas vezes e meia todas as pessoas do mundo”. Para além da ligeira morbidez do comentário, a voz do capitão do navio que nos leva lago acima, sobrepõe-se à música céltica que em fundo apronta o momento, e eleva as expectativas. “Sim ou não, resta-nos o espaço da imaginação. Há coisas que devem permanecer mistério, fazem parte da vida, e não há mal nenhum de que assim permaneçam. Também precisamos de um pouco de magia na nossa vida, de acreditar em qualquer coisa que esteja para lá dos nossos olhos e entendimento”. O Capitão Andy, “só assim”, há vinte e um anos que faz o mesmo percurso de três horas neste cruzeiro. Nunca viu nada, garante, mas não conta as vezes em que os gritos de passageiros causaram alvoroço, jurando que “ele estava mesmo ali”, que era… “Mas têm o azar de nunca tirarem fotografias ou filmarem… Paciência”, sorri. Agarra no microfone com a mão esquerda, no leme com a direita e continua a sua explicação sobre os vários mistérios da vida deste lago.
Esta região, situada no coração das Highlands não tem apenas o Loch Ness como atracção turística, longe disso. Talvez o mais próximo rival do lago, em número de visitantes, esteja alguns quilómetros a norte. O imponente e austero Eilean Donan Castle que, apesar de já muito conhecido, se tornou mundialmente famoso por ter sido palco de algumas das mais belas cenas de Braveheart, realizado por Mel Gibson, o épico que conta a vida de William Wallace, um dos heróis nacionais dos escoceses, e um ponto de passagem obrigatório.
O cenário, palco de algumas das mais sangrentas batalhas pela liberdade do reino da Escócia, parece só agora ter encontrado a paz, inserido na bucólica paisagem verdejante, mesclada pelas malhas coloridas dos turistas japoneses, americanos e australianos.
E se por um lado a película levou as origens da Escócia a conquistar a simpatia da maioria dos espectadores, por aqui, e como seria de esperar, as escolhas do realizador não são consensuais. “Sabe que aqui foi gravada uma das poucas cenas do filme passadas na Escócia, foi quase tudo feito na Irlanda. E depois, William não era nenhum santo, Robert de Bruce também não, aquilo está muito romantizado”, realça Martin Maccormack, que vive a poucos quilómetros do agora monumento. Com maiores ou menores diferenças, as opiniões não divergem muito desta. “Sabe que como vivemos a história e a conhecemos melhor, é natural que lhe encontremos maiores defeitos, mas valeu pelo esforço”.


O golfe nasceu aqui.
Um dos mais carismáticos legados da Escócia ao mundo é desconhecido para a maioria das pessoas. Tradicionalmente praticado pela aristocracia escocesa, ultrapassou as barreiras da geografia e tornou-se massificado e globalizado.
É na Escócia que se encontra ainda hoje a maior concentração de campos de golfe do mundo. Cerca de meio milhar que atraem anualmente desportistas de todo o mundo. “Hoje em dia, muitos escoceses jogam golfe, já não é coisa de ricos, e acontece que até escolhemos locais para passar férias onde existem também complexos como este, onde podemos jogar e aproveitar o clima. Albufeira por exemplo, e outras zonas do Algarve, vou lá todos os anos! Mas aqui é diferente, reconheço, a relva cresce sem a plantarmos… Se virmos de cima, do ar, a Escócia parece mesmo um campo de golfe gigante, com os lagos, as elevações e depressões do terreno, digo que nascemos para o golfe, e ele nasceu connosco”, explica com humor Garry Symins, responsável por um empreendimento dedicado ao golfe, nas redondezas de Blair Athol, localidade conhecida pelo magnânime Blair Castle, outra referência obrigatória para os apreciadores de história. Sede dos Duques de Earls Atholl, é uma das primeiras casas privadas a abrir-se ao turismo de massas sem perder no entanto um dos principais traços da tradição que se pressentem ao visitar as mais de trinta salas abertas ao público. Outro dos pormenores que a distingue de forma indelével é o facto de ser, actualmente, a única casa particular na Europa, e a última também, a possuir um exército privado de highlanders que, não tendo já de combater contra os invasores, se ocupam da lida do palácio, dos jardins às cozinhas. “Felizmente já não é preciso lutar, mas mesmo assim só se entra aqui por convite, afinal é o exército Highlander, há regras, e só nos assumimos enquanto tal em ocasiões especiais, em datas históricas e visitas de membros do Estado”, exalta George Farrow, um orgulhoso “care taker” que por aqui trabalha há mais de uma década.




Highlanders de barba rija, também sabem brincar
“Ser escocês é mais do que parecer, tem de se viver e sentir, e saber sofrer também”. Os Jogos parecem querer comprová-lo, juntando todos esses elementos numa só celebração que resume afinal, o espírito de uma terra e de um povo. O lançamento do tronco, ou o arremesso do massivo martelo de ferro por cima da própria cabeça são exemplos do que se pode encontrar quando se visitam os jogos tradicionais dos highlanders. Praticavam-nos ancestralmente para se exercitarem sem levantar suspeitas, cultivar o corpo, exercitar os reflexos, passar simplesmente por bons momentos de descontracção.
Os Highland Games realizam-se anualmente, durante o Verão, um pouco por todo o país. Numa sociedade onde os clãs ainda assumem um peso na tradição, (geralmente os membros de um clã escocês assumem o mesmo apelido e adoptam o tartan, distintivo padrão em xadrez usado nas meias, saias e capas), ganhar os Jogos não passa hoje em dia de uma luta acesa, mas apenas contra os limites do corpo. “Isto serve mais para nos distrairmos, passarmos bons momentos. O prémio não é grande coisa, dá para a gasolina”, sorri por entre as palavras Peter Whitehead, que veio de Fort William, “para participar pela primeira vez”, explica, enquanto acende um cigarro, depois de esfregar as mãos e retirar as farpas de madeira do tronco de cinco metros e noventa quilos que segundos antes arremessara. “Dizia-se que antigamente, éramos os mais fortes porque praticávamos o lançamento com as nossas mulheres… Acho que não era bem assim! Na verdade, ganha o que conseguir atirar a madeira de maneira a que ela fique alinhada connosco”. Estranha a minha expressão. “Isto não é muito científico, não são os Olímpicos, depende do juiz, de onde ele está, de quantas cervejas bebeu, e da sorte”, prossegue, enquanto vai fumando o seu cigarro e olhando de soslaio a prova dos competidores directos.
Ao fundo, a festa da celebração dos povos highlanders prossegue, com as danças tradicionais, o coro dos miúdos que tocam gaita-de-foles, as recitações gaélicas e as mini-maratonas que juntam novos e graúdos em volta da pista relvada. “No fim de contas, o que interessa mesmo é passarmos um dia juntos, homens e mulheres, como verdadeiros escoceses”.
Será este o mais essencial espírito da gente das montanhas, de Inverness a Pitlochry, de Glasgow a Edimburgo, das costas rochosas do Mar do Norte, aos mais negros e profundos lagos do interior, resume-se, e repete-se, por vezes em palavras, ou gestos simples, sorrisos, olhares, apertos de mão, reflecte-se na paisagem, na brisa suave dos fins de tarde, e parece querer dizer, que o tempo tem aqui um outro valor.

Volta ao Mundo, Setembro de 2009




Caderno de Viágem

Escócia



Como ir...


Meteorologia
Apesar de temperado, o clima na Escócia tende a ser terrivelmente instável, pelo menos para quem não está habituado. Num mesmo dia pode ter de mudar de roupa várias vezes. Convém esperar chuva, mas também calor no Verão, e temperaturas a oscilarem entre os dez e os 25 graus, enquanto que no Inverno, a chuva e neve nas terras altas sob temperaturas negativas, não deixam de fazer com que o sol brilhe também, apesar do frio, quando as nuvens se dissipam, normalmente ao final da tarde.

Fuso horário
GMT + 1 hora

Porta-Moedas
A Libra esterlina é a moeda oficial do Reino Unido desde 1971. Apesar das cunhagens e impressões diferentes para a Inglaterra, Escócia e Irlanda. Dependendo da flutuação do mercado, uma libra equivale a sensivelmente a 1,16€.
Todos os cartões são aceites.
Os preços são na generalidade bastante mais caros que em Portugal.


Como se deslocar
Não existindo uma rede de auto-estradas idêntica à portuguesa, por exemplo, a verdade é que se consegue viajar por todo o país pelas principais estradas nacionais, que se encontram em muito boas condições de preservação e segurança.
A maioria das vias possui ainda pistas para bicicletas, e não é incomum encontrar muitos viajantes a pé o que para os amantes da natureza e do esforço físico (é um país de muitas colinas) é sempre uma boa alternativa.

Onde ficar

De Vere Cameron House
Um hotel que já foi castelo, há séculos atrás. Tem como clientes habituais algumas das mais famosas estrelas do mundo do espectáculo o que não admira, pela magnífica localização dos quartos com vista para o lago, quer pela qualidade e multiplicidade de serviços disponibilizados.
A partir de 140€ em regime de dormida e pequeno-almoço.
Tel.: oo44 0845 375 2808
www.devere-hotels.com/our-hotels/cameron-house/the-hotel

Lovat Arms
Da janela dos quartos avista-se o Loch Ness. Realce também para a cozinha, que oferece a melhor e mais saborosa variedade de pratos que se pode encontrar num raio de largos quilómetros. Se pedir uma cerveja portuguesa, atender-lhe-ão o pedido, complementando com um sorriso.
A partir de 100€ em regime de dormida e pequeno-almoço.
Tel.: 0044 (0) 1456 459250
www.lovatarms-hotel.com

Athol Arms Hotel
Situado em Blair Athol, a “dois passos” quase literais de um dos monumentos mais procurados da região, o Blair Castle, situa-se igualmente a escassos quilómetros da bela vila de Pitlochry à qual se aconselha uma visita, e pode descrever-se como o mais puro e tradicional hotel escocês.
A partir de 80€ em regime de dormida e pequeno-almoço.
Tel.:oo44 01796 481205
www.athollarmshotel.co.uk/


Cuilcheanna House
Situado na margem do Glencoe Lochan, pode ser uma boa solução para quem procura ofertas turísticas orientadas para a natureza, sem no entanto dispensar o conforto e a amabilidade próprias de uma estalagem familiar de quatro estrelas. Ideal para trackers, ciclo-turistas, ou amantes da neve, uma vez que não dista mais do que alguns quilómetros da estância de Ben Nevis, a mais alta montanha do Reino Unido.
Mary e Kirstie, mãe e filha, agradecem a visita e retribuir-lhe-ão com simpatia e disponibilidade para tornar a estadia o mais prazenteira possível.
A partir de 80€ em regime de dormida e pequeno-almoço.
Tel.: 0044 (01855) 821226
www.cuilcheanna.co.uk
´

Express by Holiday Inn
Situado a poucos passos do aeroporto de Glasgow, é um moderno hotel que disponibiliza todos os serviços de que necessita, do serviço de bar às salas de conferência e reunião, dos quartos com ar condicionado, ao parque de estacionamento de fácil acesso.
A partir de 85€ em regime de dormida e pequeno-almoço.
Tel.: 0044 (0) 141 842 1100
www.expressglasgowairport.co.uk


Restaurantes e bares

The Bothy Bar
O típico pub britânico, situado em Fort Augustus. No entanto, em qualquer lugar por onde passe, se não encontrar nenhum outro lugar onde beber uma cerveja, um pub aberto encontra com certeza. Depois, a habitual simpatia de quem por lá passa os serões faz o resto.

The Lochy Bar
Em Fort William encontrará um pub vencedor de prémios, com o Canal da Caledónia a algumas centenas de metros. Para uma bebida breve, ou para uma deliciosa refeição com uma tabela de preços dentro dos valores praticados no país (cerva de 20€, refeição completa), a escolha é sempre acertada, condimentada ainda com uma fantástica vista sobre Ben Nevis.

The Cruin Bar & Restaurant
Se viajar pela paisagem rural da Escócia, a maioria dos restaurantes, estão incluídos em unidades hoteleiras. Não é o caso deste bar-restaurante, um dos melhores da área envolvente ao magnífico Loch Lomond, vista que acompanha (e melhora) a refeição.
Inaugurado em 1998, o The Cruin ganhou reputação pela qualidade de uma ementa típica Highlander, no entanto condimentada de formas e sabores “continentais”, onde os cogumelos grelhados com mozzarela, ou a costeleta de novilho regada com vinho Madeira e mostarda, são obrigatórios, num cardápio onde o preço não ultrapassa os 25€

Cornerstone Restaurant
Em Mallaig, o ideal para repousar durante as duas horas da viagem no Jacobite da West Coast Railways. Com mesas dispostas ao ar livre, embora pela certa seja aconselhável escolher por antecipação uma mesa a coberto das agruras do tempo, a verdade é que a variedade de pratos de marisco (trata-se de uma localidade piscatória) oferecidos são de regalar a vista e o estômago. Cocktail de camarão, lagostins frescos ou gambas panadas são quase obrigatórios, acompanhados de cerveja ou vinho branco, a preços que não ultrapassam os 25€, por pessoa.

Guia de viagem
O guia Escócia da American Express em português, 226 páginas, ajuda-o na descoberta plena de um país que não vai esquecer.

Na Internet
www.reino-unido.net/escocia.htm
www.visitscotland.com

1 comentário:

Anónimo disse...

Revivi memorias. Não dos imponentes e sonhadores castelos, mas sim das inebriantes destilarias. Era esse o objectivo da viagem. Whisky em qualquer hora ou ocasião. Apresentado de corpo e alma. O Diploma não deixa mentir. Num percurso entre destilarias o pequeno avião parecia ter-nos acompanhado na prova de aromas. Os quartos do hotel eram passaros. O verde esfusiante. As vaquinhas tinham casacos de pelos compridos. E os kilts usados a rigor. Bonito o texto. Fica a vontade de voltar.