outubro 12, 2009

Pública: Máscaras Improváveis - "Olivier"

Chef, mas muito mais!

A encarnação (em sentido literal) do cozinheiro com dotes de homem de negócios e vice-versa sob a perspectiva do improvável num talho do Bairro Alto.




Texto
Pedro Cativelos
Fotografia
Patrícia de Melo Moreira
Produção
Ruben de Melo Moreira


Conceito. O regresso da cozinha imaculada, da pureza dos sabores, das formas geométricas, dos aromas imagéticos que se atravessam na crueza simples dos elementos, pelas mãos de um dos mais conceituados cheffs da cozinha portuguesa. Tudo, composto num cardápio cénico, que se situa num qualquer ponto imaginário entre Sweeney Todd, e Bill de Butcher, personagem de “Os Gangs de Nova York”, interpretada por Daniel Day Lewis. Este contudo, desenrola-se no Bairro Alto, no talho do senhor Alfredo. De comum com a realidade, para além da localização no espaço e no tempo, os traços alucinogénicos, e o espírito demasiado solto, leve, sem rasteiras do entrevistado. E as carnes frias derramadas sobre o balcão de ferro frio, e as facas aguçadas em tom de ameaça. “Estou surpreendido, nunca fiz nada assim tão maluca, mas gosto! E logo eu que nunca matei animal nenhum para além de um ou outro lagostim”.
A estranheza inicial dilui-se, confundindo-se com o passar do tempo na vontade de arriscar, outro dos traços evidenciados no seu trajecto pela vida. “Aprecio as novidades, a inovação sabe? Mesmo na minha área, fui sempre um dos primeiros a trazer coisas novas para o nosso país, como o Petit Gâteau por exemplo, ou agora, com os bifes de Kobe dos quais temos o exclusivo para Portugal, feitos a partir de uma vaca que ouve música clássica o dia todo, é alimentada a cevada, bebe cerveja da melhor qualidade e é massajada constantemente para a carne ficar tenra… Têm tido um sucesso enorme!”.
Auto-retrato. Do cinema aos bifes japoneses, a mistura adensa-se, como refogado das palavras, das imagens captadas ao sabor do flash incessante em busca de mais momentos inesperados. “Sempre fui assim, quero mais, e mais, e diferente, e melhor… O céu é o limite para mim! Tenho o Olivier Avenida, e mais dois restaurantes em Lisboa, uma excelente clientela, estou bem na vida, não me posso queixar, mas não quero parar, até porque ainda não estou, nem de perto, onde quero um dia estar. Gostava que depois de morrer se lembrassem do meu nome, do que deixei cá ficar que me distinga dos outros”.
Mais do que cheff, onde começou, “quase do berço”, porque a dinastia Olivier relacionada com a cozinha, alcança já a segunda geração, o tempo acabou por lhe apresentar as artes da negociação empresarial, e das relações públicas. “A cozinha e essas duas vertentes estão interligadas de facto. Sou um cheff executivo, um restaurateur, um fazedor de restaurantes digamos. Confecciono as listas, componho os pratos, organizo, lido com os clientes, estou com eles… E se quer que lhe diga, nem tenho saudades de estar metido o dia todo na cozinha! Posso com isso não ser o melhor cheff, mas ganhei outras coisas, porque gosto de ser completo, de fazer isto bem, sem sair da minha área que é a restauração, e quero sempre ser o melhor, isso é a base a que me agarro para me atirar para tudo o resto”.
Máscaras improváveis. “As depressões por exemplo, ou aquilo em que me queriam tornar nas fotos, num serial killer se calhar! Isso seriam máscaras verdadeiramente improváveis para mim, até porque mesmo se quisesse não tinha tempo, nem para estar deprimido, ou triste sequer”.



Para homem que cultiva os sabores, exige-se que saiba igualmente colher os prazeres, sejam eles os da carne, ou de outro condimento qualquer… “Sim, claro, a comida é um deles! Depois, os carros, a beleza feminina, tudo coisas que me fazem bem. E trabalhar, claro porque em Portugal, é complicado. Se não temos jogo de cintura caem-nos em cima, com as críticas, com o estarem sempre a dizer mal, isso irrita-me. Acho que o país tem de melhorar nisso”.
Para o que está imediatamente para lá do olhar, a constatação de alguém que é impossível de se servir frio, insosso, ou desapegado de emoções. “Só sei ser assim, sou emocional, posso ter mau feitio quando as coisas não são como quero, mas sou eu, e só tenho uma palavra. Sempre o tentei ser, alguém que diz claramente o que pensa, sem rodeios, e sempre com verdade mesmo que dolorosa. Acho que isso se nota, é o que pretendo, nos meus pratos, nos meus restaurantes, e em mim”.

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