julho 08, 2008

Pública: Um dia com... João Adelino Faria

Dias do avesso


Acorda normalmente às quatro e meia da manhã para entrar no Rádio Clube às seis. Depois... a magia que se diz que a telefonia tem, e que redescobriu há ano e meio quando aceitou o convite para devolver as manhãs à Rádio.


Texto
Pedro Cativelos
Fotografia
Patrícia de Melo Moreira



Noite cerrada ainda. Na Sampaio Pina, onde fica o Rádio Clube Português, nem os cafés estão abertos, apesar do aroma a bolos acabados de fazer. Os maços de jornais permanecem atados no chão, amontoados perto do quiosque da esquina, e os gratuitos espalhados na entrada do edifício são ainda os do dia anterior. Vinte minutos para as seis da manhã. A porta automática abre-se, ao mesmo tempo que a as máquinas de café começam a funcionar, em sincronismo inesperado para quem não conhece o ritual. “Olá, bom dia... aliás boa noite, ainda!”.
Passo acelerado, principais diários debaixo do braço, fato completo, sem gravata. “Não consigo andar devagar, Life is to Short! Adorava poder vir de ténis, mais à vontade, mas tenho normalmente vários convidados em estúdio ao longo da manhã e não pode ser, infelizmente”. O sorriso soa a franco, bem disposto, habituado à nova rotina que dura há ano e meio, quando decidiu sair da SIC, e aceitar o convite de Luís Osório para assumir o cargo de director adjunto e coordenar toda a informação do novo projecto da Media Capital.


Minuto a minuto

A redacção de onde saem as notícias que preencherão as próximas cinco horas de emissão, entre as sete e o meio dia, sente-se viva, apesar dos olhos avermelhados e sensíveis à luz artificial. João Adelino anda apressado, cumprimenta toda a gente que o acompanha desde início na sua “aventura séria”, como lhe chama. O seu telefone toca, logo desde manhã cedo, numa constância que se prolonga pelo dia fora. “Nada me faz desligar o telemóvel”, confessa enquanto se apressa com um molho de notícias numa das mãos.
“Hoje temos uma manhã longa, variada e... ainda nem começou. Isto de entrevistar o presidente da PT Multimédia primeiro e depois os Rádio Macau tem que se lhe diga, é uma grande diferença, requer preparação, mas é interessante para mim enquanto jornalista até porque normalmente termino com a parte cultural que é mesmo para saborear”. Chamam-no ao estúdio, para alinhavar o guião. Catarina Silva e Bruno Santos são os produtores do Minuto a Minuto, desde o início de 2007. “Conhecem-me as más disposições todas”, humoriza. “É verdade”, gracejam.
“Já entrevistei quase toda a gente. As que mais me marcaram?! Bem... depende. Normalmente com os políticos faz-se aquele jogo tradicional em que eles já vão preparados para as perguntas e eu já estou preparado para as respostas. Mas há pessoas fascinantes em todas as áreas. Posso dizer que a pior que fiz foi com as Spice Girls, quando estavam no auge, não saiu nada dali! Mais recentemente lembro-me da entrevista com o Paulo de Carvalho, e com o Herman em que conseguimos atingir momentos tocantes que não estavam previstos e que no fundo são aqueles em que se tem mais gozo de estar a conversar com alguém e a partilhar isso com quem nos está a ouvir”.
Café em copos de plástico, uma presença indisfarçável em qualquer lugar de trabalho matutino. Três, dois, um... A contagem feita com os dedos, conclui-se com um acenar de cabeça mútuo, do lado de lá e de cá do vidro que separa os estúdios de emissão e produção. “Bom dia, são sete horas...”. Informação. Minutos depois, durante a publicidade, vai passando os olhos pela SIC Notícias. “Saudades? Da televisão algumas... Foram muitos anos, ainda é onde me sinto mais à vontade e até por isso funciono com a equipa e com o próprio local, como se de um estúdio televisivo se tratasse. Sinto principalmente falta das pessoas, mas com essas vou estando para por a conversa em dia. Sei que foi estranho para muita gente ter deixado a televisão mas estas mudanças fazem parte da vida e posso dizer que hoje, um ano e meio depois, estou feliz por ter dado este passo”.


Homem da cidade

João Adelino Faria nasceu em Castelo de Vide, no interior do Alentejo, “tão longe de tudo isto... Ainda lá regresso, quando preciso de recarregar, ou descomprimir”. Hoje na casa dos quarenta, depois do curso de direito, concluído “para fazer a vontade” ao pai, acabou ao longo dos anos por experimentar profissionalmente todos os meios de comunicação. Começou por estagiar no antigo semanário Sete, seguiu para O Jornal, passou pelo Jornal de Letras e mais tarde ingressou no Correio da Manhã Rádio. Na SIC desde os primeiros dias da estação, onde foi, para além de pivot do Jornal da Noite, correspondente em Londres, acabou por se tornar numa figura pública, estatuto que rejeita pelo menos na formulação mais associada ao termo. “Na rádio, querem falar com o João... Recebo muitas cartas, algumas de pessoas que têm vidas complicadas e que me dizem que as ajudei em algum momento, em função do meu trabalho, isso é mais fácil de acontecer aqui e é gratificante! Como pessoa, sou reservado, acredito que um jornalista tem de seguir uma certa linha de conduta, por respeito à profissão, não se pode tornar ele próprio na notícia”.
Jornalista então de manhã, director adjunto à tarde, quando regressa à secretária do seu escritório com vista sobre a redacção e um pedaço de luz natural que ilumina os livros e os cd´s que traduzem o cenário para algo mais pessoal. “Faz parte do projecto que aceitei, tenho uma série de reuniões de trabalho, e depois preparo a emissão do dia seguinte para amanhã estar tudo em ordem quando chegar”.


Livros de fim de tarde
Um dia de sol costuma pedir um passeio. “Muitas vezes, o que ma falta é tempo que tenho pouco!”. No topo do Parque Eduardo VII, perto do edifício onde passa a maior parte do seu dia, costuma tomar um café ou uma água das pedras, apreciar o horizonte que se vê daqui, por entre os prédios da baixa pombalina, o pedaço de Tejo a passar, lá ao fundo. “Fantástico este retrato não é?!”. O telefone toca.
Leitor “compulsivo”, sente-se à vontade a percorrer os corredores da Feira do Livro que já está em plena actividade. São inúmeros os títulos que lhe puxam a atenção, despertam a curiosidade, que lhe avivam memórias antigas. “Olha aqui está... O Príncipe, de Maquiavel, um dos meus livros preferidos! Lembro-me que numa aula de direito o professor Marcelo no-lo aconselhou! Anos mais tarde quando o li, achei fascinante e percebi então as referências que nos tinha feito”. Uns passos mais à frente, um outro clássico. “Já o Principezinho... nunca percebi o fascínio!”. No stand da Relógio D'água, o seu nome numa capa, algo raro. “Não é um livro meu, é apenas uma compilação das minhas conversas com o Daniel Sampaio no Rádio Clube. Escrever, eu?! Só para mim, quando chego a casa, ou estou com vontade de exorcizar algo de bom ou mau, não tem valor literário!”, lança com um sorriso.
“Já vai longo o dia”. Quando estava na SIC, fazia as noites e chegava normalmente a casa de madrugada. Sintonizava os serões com a SkyNews, ou com o Sexo e a Cidade. Hoje acrescentou-lhe a Al-Jazeera, onde reconhece muitos dos colegas com quem conviveu em Londres, onde abriu e fechou a delegação da estação de Carnaxide. "Estava num prédio onde havia correspondentes do mundo inteiro, foram bons tempos de vez em quando revejo-os no cabo". As preferências mantém-se, a rotina é que mudou na ordem proporcionalmente inversa. “Deveria deitar-me às dez, mas acabo sempre por adormecer por volta da meia noite, isto é violento, preciso de férias”, graceja.
Um dos hábitos que preserva tem a ver com viagens, outro dos seus grandes prazeres na vida e com uma rotina anual, esta mais simpática que a maioria das rotinas "Sim, normalmente em Agosto, costumo ficar pela Califórnia um mês. Tem praia e bosque... Mas também adoro Nova Iorque, é A cidade, ali estou sozinho. A minha manhã perfeita começaria sempre no Central Park a ler o New York Times, é fabuloso". Sorri, com ar nostálgico de quem pensa fazer desse prazer, uma constante diária. “Não! Ainda é cedo para me reformar, há muita coisa a fazer até lá! Daqui a dez anos, onde me vejo?! Não sei, toda a minha vida as coisas me foram acontecendo naturalmente... Neste ritmo talvez não, até porque a idade já vai batendo à porta, mas o futuro o ditará”.

1 comentário:

Inês Sousa de Menezes disse...

Boa noite,
chamo-me Inês Sousa de Menezes e sou finalista do curso de Direito na Universidade Católica Portuguesa. Hoje, no Job Shop organizado pela minha faculdade tive o enorme prazer de conhecer João Adelino Faria, tendo sido o escolhido para moderador do debate «Diversificação nas Saídas Profissionais», no qual pouco falou sobre o seu percurso, mas a mim era o que mais me interessava. Pois é, estou a tirar Direito, mas desde que entrei que sabia que o que realmente queria era Jornalismo, soube-o nessa altura e ainda o sei agora. Fiquei feliz por ontem também ter conhecido Inês Serra Lopes, tanto um como outro me disseram que fiz bem em escolher Direito, mas que mal terminasse a licenciatura deveria começar a ingressar no fantástico mundo do jornalismo.
Ora o Pedro faz algo que eu gosto mais, não me imagino como pivot de um telejornal, nada disso, eu gosto é de escrever! Aliás sempre escrevi textos que guardei para mim, relatos de factos interessantes que presenciei, acontecimentos que me fizeram surgir inúmeros pensamentos nesta jovem cabecinha...tudo era pretexto para eu escrever! Até que fui de Erasmus e comecei um blogue (http://erasmusemitalia.blogspot.com/), para poder descrever o meu dia-a-dia durante esses 5 meses. Ora quando voltei a Lisboa quis continuar, por isso criei outro blogue (http://inesinesperado.blogspot.com/), no entanto já não escrevi tanto neste, por parecer que tinha ficado sem "assunto" e, por muito incrível que pareça, sem tempo...pois é, em erasmus tive uma vida louca e mesmo assim conseguia umas horas para me dedicar à escrita, mas em Lisboa, de volta à vida rotineira, parece que nunca consigo fazer tudo o que quero.
Para não me alongar mais passo já para o meu propósito: adorava conhecê-lo Pedro, porque a verdade é que me sinto um bocado perdida, não sei qual o passo seguinte, o que é que devo fazer se realmente quero jornalismo? Por onde devo começar? Um estágio de Verão? (tenho medo de ninguém me querer visto que tirei Direito e não Comunicação Social) Um mestrado? Em Portugal ou lá fora?
Gostaria muito que me pudesse dar algumas orientações, se possível.
Deduzo que seja uma pessoa ocupada, mas aguardo ansiosamente a sua resposta.
Os melhores cumprimentos,
Inês Sousa de Menezes