outubro 13, 2008

Notícias Magazine: Terapias Alternativas, Segunda opção ou a derradeira resposta interior?


A maioria provém de conhecimentos milenares que, fundamentam até grande parte dos conhecimentos adquiridos pela medicina convencional. Para o corpo e para o espírito, acupunctura, reiki, shiatsu, terapia de som, são as curas da moda em Portugal.



Na última década, a procura de medicinas alternativas tem crescido consideravelmente entre os portugueses. Num momento em que se definem os quadros legais para enquadrar apenas algumas das dezenas de terapias disponibilizadas no nosso país, as razões para o crescimento da procura não surpreendem. Desiludidas com a medicina convencional, encharcadas em medicamentos, cansadas das listas de espera, porventura órfãs de uma crescente obsessão pela saúde do corpo, pelo bem-estar interior, cada vez mais pessoas vão procurando novos caminhos para readquirir ou conquistar o bem-estar.

Texto
Pedro Cativelos
Fotografia
Patricia Moreira



“Relaxe… Isso... Esvazie a cabeça, deixe-se ir”. A atmosfera preenche-se de aromas tranquilizadores, flores de artemísia incensadas em fios que rumam sem lugar marcado na ligeira corrente de ar, dissipando-se nas ondas sonoras, serenas, que tranquilizam o ambiente e as primeiras dores de quem por ali passa, procurando afastar o sofrimento.
No terceiro andar do Atheneu de Lisboa funciona, desde 1992, a Escola Superior de Medicina Tradicional Chinesa, a primeira do país. Funcionando segundo o modelo da Universidade de Medicina Chinesa de Nanjing, com a qual mantém também uma colaboração estreita, nomeadamente no estágio de final de curso de cinco anos que é feito naquela instituição, uma das mais conceituadas na área, dedica-se ao ensino e à prática da cura. Pelas mãos dos mais de oitocentos alunos que por aqui passaram ao longo dos anos, largos milhares de pacientes de todas as idades e proveniências sociais já chegaram, partiram e... regressaram também. “Logo desde o primeiro ano os alunos começam a lidar com pacientes, devidamente acompanhados por profissionais mais experientes, claro! Mas temos de tudo, de professores a juízes, de desempregados a cirurgiões... Muitos destes que vêm cá como doentes, depois voltam, com curiosidade de ficar a conhecer a medicina que os conseguiu curar”, explica o anfitrião e fundador da Escola, José Faro.
“Tranquila... Sente-se melhor?”. Acena que sim. “Nem isso conseguia fazer quando cá cheguei, e nem tinha muita vontade, para ser sincera... Andava completamente desanimada”. Maria Salgado tem 47 anos. Experimentou a acupunctura há pouco mais de dois. Como na maioria dos casos que se encontram pelas marquesas da sala de tratamentos, depois de passar pela medicina convencional sem grande sucesso, e com o agravamento dos problemas na cervical, acabou por ser aconselhada a experimentar uma da últimas saídas que se lhe avistavam para se ver livre da dor que já quase a impedia de sair à rua. “Como sempre, acabamos por ouvir alguém dizer que resultou e estamos tão desesperados que acabamos por pensar: ´E por que não?!`. Resultou e hoje confessa sem dificuldade que a sua experiência com as agulhas foi simplesmente “a concretização de um sonho, voltar a ter a minha vida de volta. Agora, faço o mesmo que fizeram comigo e recomendo isto a toda a gente”.
José Faro, sorri. “É o nosso maior objectivo, fazer com que saiam daqui melhor que quando entraram, é para isso que trabalhamos e damos formação. Mas deixe-me que lhe diga que ao contrário do que a maioria das pessoas pensam, medicina tradicional chinesa não é só acupunctura, isso deve-se ao facto de utilizar agulhas, algo que obviamente captou mais as atenções principalmente quando falamos do início do século passado, por se afastar dos padrões clínicos convencionais da época. Muita gente pensa que as agulhas têm algum poder especial, mas claro que não. A recuperação de um doente que opte pela medicina tradicional chinesa começa na consulta, quando vemos e sentimos o paciente e as melhorias muitas vezes podem ser feitas através de correcções na alimentação por exemplo, por vezes basta isso para reequilibrar o corpo energeticamente! Depois há, claro, todos os outros tratamentos baseados num conhecimento com mais de 5 mil anos de prática confirmada, e recordo-lhe que a medicina ocidental tem menos de metade”.


À boleia de novos conhecimentos
Depois de ter frequentado um curso de psicologia em Coimbra, José Manuel Correia, partiu para Oriente. A acompanhá-lo, apenas uma mochila e um bilhete de ida, carregado de ilusões. Cursou psicologia médica em Manila, descobriu as artes marciais e as medicinas orientais no Japão, onde permaneceu durante dez anos e... regressou. Fundou então a Associação Portuguesa de Ninpo Shiatsu Aikijujutsu.
Na Marinha Grande desde 1990, o seu trabalho divide-se entre as artes marciais, a prática da terapia Shiatsu e o ensino “Sou um clínico geral deste tipo de medicina”, explica.
Apesar de reconhecer não ser esta, uma técnica infalível para a resolução de todas as maleitas, e reconhecendo que muitos casos “só podem ser tratados pela medicina convencional” releva o Shiatsu como um meio de cura “extraordinário”, ressalva. “Sim, desde as dores ciáticas, ao reumatismo, passando pela miopia e diabetes, entre muitas, muitas outras”.
Victor Manuel Pereira é um caso diferente. Terapeuta com consultório aberto em Lisboa, evoluiu na prática da acupunctura e do Shiatsu ao mesmo tempo e foi sendo conquistado pelos resultados. O seu interesse pelas medicinas alternativas orientais começa a desenvolver-se através das viagens que foi fazendo pela Europa e pelos Estados Unidos. “Senti a necessidade de aprofundamento do que ia descobrindo”, começa por dizer. Foi assim conduzido à realização de estudos no âmbito destas técnicas terapêuticas “Não só as medicinas de inspiração oriental têm uma visão global do corpo, como a medicina convencional também já a tem e vai buscar algumas técnicas e conceitos alternativos, porque a visão actual é cada vez mais integrativa”, atesta. Começa assim por defender um novo paradigma para uma também ´nova saúde`. “A qualidade deve prevalecer sempre sobre a quantidade. Amo todos os meus pacientes sabe?!”.
E em sua opinião nem é difícil saber exactamente qual é o melhor método para avaliar os pacientes que lhe preenchem as consultas que dá no Centro Português de Astrologia Quiron de Lisboa. "Os princípios do Shiatsu são muito úteis na maioria dos casos, mas se após um número razoável de 4 a 6 tratamentos um doente não apresentar melhoras, encaminho-o para outra medicina porque o importante mesmo é garantir que os doentes façam uma escolha informada e adequada à sua necessidade e que afinal, se recuperem”.


Meditação, Natureza e Paz

Com uma componente filosófica, psicológica e mística mais vincada encontram-se outras disciplinas curativas como o Reikki, uma antiga arte tibetana de canalização da energia vital pela imposição das mãos, redescoberta no Japão, em meados do século passado. Este conhecimento ancestral é um dos que mais tem despertado a atenção e a curiosidade dos muitos portugueses que já vão aderindo em massa às aulas disponibilizadas em health centres e ginásios de todo o país. "Sendo o Reiki uma técnica fácil e eficaz para a reposição do equilíbrio energético e da aquisição de auto-conhecimento, procuramos que ele chegue dentro dos parâmetros e qualidade imprescindível, a todos aqueles que querem aprendê-la", refere Carlos Marques, director da Escola Portuguesa de Reikki.
Razões para tão grande aceitação da terapêutica por parte do público a tal ponto de se tar tornado quase numa moda? “Sim... Mas é um facto que só vem confirmar um dado evidenciado, por exemplo, aquando da visita de Dalai Lama a Portugal. Por muito estranho que isso possa parecer, até à própria filosofia tibetana, o Budismo está na moda ente nós. O facto de estar na moda trás muita gente de facto, mas como em todos os fenómenos de massas, no final, apenas fica quem acredita, e quem de facto acaba por se identificar com a filosofia do Reikki”.
Labsong Dorge, ou Mente Realizada nas palavras do tibetano, é precisamente um budista português, que “desde muito pequeno", influenciado pelo pai e pelo tio perfilha dos valores tradicionais da cultura do Tibete, do Nepal e da Índia. De então para cá, perdeu-se e reencontrou-se mais vezes que as que desejaria, até por fim, calcorrear o caminho certo, direcção que o levaria à tranquilidade que diz agora conhecer. “Há mais de vinte anos que me vou aperfeiçoando, actualizando, crescendo dentro disto que descobri... Até que o destino me trouxe até aqui”. Nuno, o seu outro nome, mais português, faz terapia de som. Utilizando taças tibetanas, constituídas por uma liga metálica composta por ouro, prata, cobre e diversas outras composições metálicas, posiciona-as sobre os pontos vitais do corpo do paciente, fazendo-as vibrar. As ondas sonoras emanadas pela vibração do metal, dependendo da intensidade utilizada, actuam como se de uma massagem se tratasse, esta sem a utilização das mãos e a um nível intracelular. As velas compõem a ambiência, onde o laranja suaviza a rigidez trazida do mundo exterior que, por ali, parece afastado para não mais do que uma ténue certeza de regresso inevitável.
Durante a sessão, que de pode prolongar por mais de uma hora, vai recitando mantras tibetanos, que acompanham o ritual terapêutico. “O que faço é um tratamento e não uma cura, até porque essa reside dentro de cada um! Sim, creio ser esse o meu desígnio, fazer despertar a pessoa para a sua verdadeira finalidade neste mundo, ajudá-la, partilhando o que sei, o que fui aprendendo, de forma a que se liberte dos medos e frustrações que lhe roubam energia e a tornam mais atreita à doença”.

O melhor de dois mundos
Se na China, por exemplo, a medicina ocidental conquista espaço em muitos dos hospitais, que possibilitam aos utentes a possibilidade de optarem entre a medicina ocidental e a tradicional, do lado de cá do planeta, o caminho percorre-se, com ou sem ironia, ao contrário. Em Inglaterra algumas terapias alternativas já fazem hoje parte do sistema nacional de saúde e até em Portugal, apesar de ser esse ainda um cenário que não se coloca, a Medicina convencional aproxima-se cada vez mais das suas parceiras alternativas. Exemplo prático dessa realidade torna-se facilmente observável em algumas clínicas que as emparceiram no leque de serviços a prestar aos consumidores.
Começa assim a deixar de ser estranho encontrar num mesmo local, médicos, psiquiatras, naturopatas, homeopatas e todo o tipo de terapeutas de várias disciplinas naturais. O Instituto Azul, na cidade do Porto é um bom exemplo desta nova realidade, pois entrelaça diferentes mundos das ciências humanas que até costumam andar de costas voltadas. Tudo em nome da “credibilidade” como Ana Sofia Carvalho costuma dizer. Até porque, explica a gestora do espaço, “todas as terapêuticas são abordagens diferentes mas igualmente eficazes de tratar o ser humano nas suas várias dimensões”.
Mas pode esta aproximação entre conhecimentos aparentemente tão distintos ser benéfica para os pacientes? Duarte Almeida, especialista em endocrinologia e professor da Faculdade de Medicina do Porto não tem dúvidas. "Não julgo a validade das outras práticas nem vou encaminhar os meus pacientes para disciplinas que não conheço, mas se os ajudarem psicológica ou espiritualmente, isso só pode ser benéfico", assinala o clínico. No entanto, e apesar deste caso de sucesso, outros há que levam o presidente do conselho científico da Sociedade Portuguesa de Médicos Acupunctores a colocar algumas reticências nesta súbita implementação das terapias alternativas. “O Estado deve regulamentar convenientemente e com urgência o exercício destas terapêuticas, à semelhança do que se faz noutros países, por exemplo a Inglaterra, onde várias estão já integradas no Sistema”, alerta. A regulamentação, explica, apenas trará, benefícios. “Sim, mais transparência a um mercado inundado subitamente de terapeutas sem preparação, através da definição de uma formação mais exigente e condições adequadas dos locais em que muitas vezes são praticadas”.


Caixa:

De alternativas a massificadas
A curiosidade acerca das terapias chamadas alternativas acontece pela primeira vez na década de 60, num período marcado pelo movimento hippie, pelo naturalismo e pelo vegetarianismo. É então nas reminiscências dos movimentos sociais da década de 70 com a crescente industrialização que se passam a questionar os conceitos de saúde e o sistema médico predominante. Surgem os primeiros movimentos ecológicos, acompanhados de novas preocupações nutricionais que alimentam massivas tendências urbanas, novos males e novos remédios, pelo menos nas sociedades ocidentais. Oficialmente, as terapias alternativas, milenarmente utilizadas na China, no Japão, na Índia, no Tibete e em todo o Oriente, começam então a propagar-se pelo velho mundo.
Desde então, a tendência é global. Por todo o lado tem havido um aumento da popularidade das medicinas alternativas, do Japão aos Estados Unidos da América, passando pelo norte da Europa, até à Oceânia... E também por Portugal. Exceptuando o prematuro exemplo de Garcia de Orta que viveu cerca de 34 anos em Goa, e por lá estudou plantas e tratamentos medicinais indianos, deixando uma tão vasta quanto esquecida obra sobre a matéria, apenas na última década do século passado as mais variadas terapias e cuidados corporais ultrapassaram definitivamente as barreiras da compreensão e passaram a estar na moda entre os portugueses, como o revelam diversos estudos publicados nos últimos anos sobre a matéria.


Portugal procura cada vez mais Alternativas
No nosso país, a procura por terapias naturais intensificou-se de tal forma nos últimos anos, que o Governo se viu obrigado à elaboração de uma lei que enquadrasse a actividade e o exercício dos seus profissionais. A Lei nº 45/2003 reconheceu autonomia clínica a Acupunctura, Osteopatia, Homeopatia, Naturopatia, Fitoterapia e Quiropráxia, considerando ainda a sua base filosófica diferente da medicina convencional, todavia com processos específicos de diagnóstico e terapêuticas próprias.
Feito assim o enquadramento base de algumas destas terapêuticas, estabelecendo as que são reconhecidas, bem como os parâmetros da acreditação dos seus profissionais, muitas outras acabariam no entanto à margem da legalização.
Apesar da legalização destas actividades, ainda hoje, cinco anos depois, a discussão em torno das especificidades da lei impede o seu completo funcionamento. Os cursos não possuem equivalências a bacharelatos ou licenciaturas, e muitos dos profissionais da área subsistem ainda na clandestinidade.


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Terapias

Cerca de trinta por cento da população europeia recorre ou já recorreu a pelo menos a uma terapêutica complementar ou alternativa. Em Portugal, o número de centros onde se podem encontrar transcende largamente as duas centenas de espaços, e é bastante acessível, apesar de um pouco dispendioso (os preços são muito variáveis e podem ir dos trezentos, aos três mil euros) entrar num curso de formação dedicado a qualquer uma delas.

Acupunctura
Ramo da medicina tradicional chinesa, que utiliza a introdução de agulhas muito finas, com a finalidade terapêutica de reequilibrar o fluxo energético do organismo ou para induzir um mero efeito analgésico. Também existe uma vertente que se pratica durante o parto, sendo uma prática cada vez mais procurada para melhorar a gravidez. Em Portugal terão já havido cerca de uma centena de bebés nascidos com a ajuda da medicina chinesa.

Aromaterapia
Uso de óleos essenciais e aromas de plantas como recurso terapêutico para vários males.

Cromoterapia
Ciência que utiliza as cores para estabelecer o equilíbrio e a harmonia do corpo, da mente e das emoções.

Feng Shui
Método milenar chinês para harmonização de ambientes.

Fitoterapia
Sistema terapêutico em que as plantas medicinais são utilizadas com a finalidade de restaurar as funções do corpo humano.

Terapia Floral
Remédios à base de flores, desenvolvidos pelo médico inglês Edward Bach, para tratar males da alma, como a ansiedade, o medo e a timidez.

Liang Gong
Técnica chinesa que utiliza movimentos lentos e contínuos onde cada um interfere com uma parte específica do corpo.

Naturopatia
Terapêutica baseada no principio da auto-regeneração corporal. Através da avaliação do estado global do organismo, é utilizada a prescrição de dietas, suplementos dietéticos, exercícios físicos e outras terapias, promovendo e estimulando as defesas naturais do corpo humano.

Osteopatia
Sistema de diagnóstico e tratamento, cuja utilização principal se situa nas maleitas do sistema músculo-esquelético. Utiliza principalmente métodos de tratamento à base de manipulações suaves, para restabelecer e manter as funções biomecânicas corporais.

Quiroprática
Método de tratamento que enfatiza as disfunções vertebrais como causa primordial para o aparecimento de várias patologias, utilizando métodos de tratamento idênticos aos da Osteopatia.

Tai Chi Chuan
Movimentos de luta em câmara lenta, simulando acções de animais e fenómenos da natureza. Aguça os sentidos e aumenta a concentração e a flexibilidade.


Notícias Magazine, Outubro de 2008

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