agosto 22, 2007

Serra d’Ossa renasce das cinzas





Há um ano, o Verão foi escaldante. As suas encostas que se elevam a norte com vista para as Serras Beirãs e para oeste, para a Arrábida e Montejunto foram inundadas pela ira do fogo. Doze meses depois, o regresso ao local para ouvir os intervenientes e estabelecer um ponto de situação no processo de recuperação da Serra d´Ossa. Alguns dos projectos estão já em marcha. As máquinas estão em movimento, os acessos terrestres foram melhorados, as árvores assassinadas foram cortadas e a seu lado, nascem agora novos rebentos de esperança num futuro que não pode esperar.

Por,
Pedro Cativelos


Faltam ainda alguns anos e muito trabalho e esforço político e social para que tudo volte a ser como dantes. Mas hoje, no seu mais alto cume, S. Gens a mais de 600 metros de altitude, parece vislumbrar-se um novo começo num ainda ténue respirar do pulmão de vários concelhos alentejanos… Por entre Estremoz, Borba, Vila Viçosa, Alandroal e Redondo, reergue-se de novo, majestosa na paisagem alentejana, a Serra d’Ossa.
Durante um quarto de século a Serra d’Ossa não sentiu o calor do fogo. Mas aquela que se ergue no coração do Alentejo, de origem e nome recuperado na ancestral história da geologia humana, carregada de mistério e misticismo, provaria o sabor da penumbra negra, encharcada em cinza nos primeiros dias do mês de Agosto de 2006, quando se tornou combustível para o gigantesco incêndio que lhe fez perigar a existência milenar. Populações, animais e haveres pereceram. A paisagem ficou mais pobre, calcula-se que em cerca de 5 mil hectares de fauna e floresta que terão sido consumidos sem perdão. As chamas, lavraram sem descanso ao longo de vários dias, atingindo áreas florestais integradas nos concelhos de Alandroal, Borba, Estremoz e Redondo.
A catástrofe desencadeou o Plano Distrital de Emergência e o envolvimento das diversas corporações de bombeiros e autarquias do Distrito de Évora. Muitos homens combateram ali um destino que muito dificilmente poderia deixar de ser… negro.
Mas a vontade humana, e a força do carácter de bombeiros, autarcas e fiéis amigos da natureza decidiram alterar esse ensejo, transformar ideias tantas vezes esvaziadas de acção em concretizações práticas para combater a tendência das coisas más. O Inverno prolongado também deu a sua ajuda. A "obra", essa, já está à vista.

"Reconquistar tudo o que se perdeu"

Em todo este processo de revitalização da Serra foram preponderantes as acções desencadeadas pela governadora civil de Évora, Fernanda Ramos. Desde o momento em que tomou conhecimento da tragédia, garantiu ser "fundamental continuar a preservar o património e reconquistar tudo aquilo que se perdeu", disse, há um ano atrás.
Desde então, o Governo Civil do distrito de Évora em conjunção com outras forças vivas da região tem vindo assim a promover um conjunto de encontros de trabalho entre os agentes envolvidos na problemática dos incêndios e as autarquias do perímetro afectado. Durante um ano avaliaram-se os estragos, perspectivaram-se soluções, iniciaram-se os trabalhos.
A recuperação deste recinto natural de excelência foi precisamente um dos objectivos que baseou a aprovação do projecto da Associação de Produtores Florestais (AFLOPS) que agora se apresta para avançar. A sua concretização conta já com algumas intervenções em curso (limpeza das matas, abertura de corredores de segurança, reflorestação localizada) e surge depois da candidatura da associação ter sido aprovada no final de Junho, pelo Ministério da Agricultura. Em declarações ao Diário do Sul, Nuno Santos Fernandes, vice-presidente da AFLOPS considera este como um "projecto renovador e inovador simultaneamente".
Todavia, para o responsável da AFLOPS, este representa apenas "um indispensável primeiro passo para a criação de um Plano Integrado de Recuperação da Serra d´Ossa, cuja reflorestação tem de ser feita de forma a que se acautelem os previsíveis riscos de outros grandes incêndios", reitera.
O Plano de Controlo de Erosão na Área Ardida da Serra d´Ossa, apresentado em Junho último, prevê assim uma comparticipação de 80 por cento por parte da União Europeia e do Estado português. A candidatura, única para toda a área atingida pelos incêndios, assentou num estudo desenvolvido pela Aliança Florestal (Grupo Portucel-Soporcel, detentor de parte substancial do eucaliptal ardido) com um único objectivo: "Afastar uma área sensível como esta dos potenciais fenómenos erosivos em área ardida", os quais, segundo a AFLOPS, "têm inúmeras consequências nefastas. As mais evidentes? Posso dar-lhe o exemplo da destruição de caminhos e passagens hidráulicas e a contaminação de águas… A mais longo prazo, a perda de solo produtivo pode ser um obstáculo terrível e atingir proporções assustadoras sendo praticamente irreversível", esclarece. Por isso, assevera, "temos de actuar com celeridade e espírito de sacrifício, até porque, ainda há um longo caminho para percorrer", alerta o dirigente da AFLOPS.
Hoje, a encosta Norte permanece manchada pela devastação, numa paisagem enegrecida ainda em alguns dos seus horizontes. Mas na terra, os troncos parcialmente ardidos já foram cortados. Renasce vida à sua volta. Em determinados locais crescem mesmo novos eucaliptos (que na década de 50 transformaram a serra no maior eucaliptal de Portugal), irrompem jovens plantas, regressam os bichos com a verdejante vegetação que já assimilou a terra queimada, transformando-a agora, em flores.
Não cheira mais a morte, e este Verão traz consigo um odor diferente daquele que por aqui passou há quase doze meses. Cheira a vida, outra vez.

Julho, 2007
Diário do Sul

agosto 21, 2007

“Sou inconsequente em tudo”



Iniciou-se na escrita em 1990 com o romance “O Nó na Garganta”. Inaugurou um novo estilo literário, dedicado às pequenas coisas que perfazem o mundo do quotidiano. Sensível, intimista, geracional, estrondosa no número de livros vendidos, quase tão imenso como a inusitada avalancha de seguidores. Mordaz, cativante, diferente, Rita Ferro apresenta-se em “O Sexo na Desportiva”, mutável como as suas palavras, ousada, natural como a vida que absorve “com intensidade absoluta”.

Por,
Pedro Cativelos
Fotos,
Patrícia B. Moreira


Com o livro nas mãos, como se sente ao olhar para ele?
Estou cada vez menos entusiasta na recepção de um livro. Já não sinto aquele sobressalto das primeiras obras…

Um novo estilo na sua escrita, agora mais condimentado…
É a primeira vez que escrevo sobre coisas mais picantes, misturando uma série de crónicas que fiz para a “A Bola” e para o “Correio da Manhã”. Tive algum pudor, confesso, mas são apenas histórias malandrecas e sempre redimidas pelo humor.

Onde se foi inspirar para “penetrar” neste universo do desporto e do erotismo?
Baseei-me num livro de desporto que tenho aqui e que fantasiava sobre isso, resultando daí diversas histórias de aproximação entre pessoas.

É uma mulher inconstante?
Vivo com uma intensidade absoluta, mas… normalmente nada é tão interessante quanto o imagino previamente, farto-me das pessoas, dos amigos, de mim própria, por vezes…

E da escrita, ainda não se fartou?
Sou inconsequente em tudo, mas não no sentido renunciante... Mudo a página! Na escrita, sei que não morria se não escrevesse, mas gosto de o fazer!

Criou um estilo, ou simplesmente o inaugurou entre nós?
Tenho a noção que não faço grande literatura. Mas sei que fui a primeira a trazer para Portugal um certo tipo de escrita que até aquele momento não existia no nosso país.

Mas mudou a face da literatura portuguesa. Para melhor, ou pior?
Isso trouxe consequências, e muitas, é verdade! Algumas boas, outras nem tanto…

Maio, 2007

As melhores praias do Alentejo




O Alentejo é feito de costas abruptas e encostas suaves, erguido nos montes, nascido nas plantações, renascido no turismo, alimentado na boa mesa, retemperado nas praias, muitas, das melhores que o nosso país tem a oferecer. De Tróia a Odeceixe, na fronteira com o Algarve, as finas areias brancas, diluem-se na paisagem do mar infinito, azul, contagiante, contrastante, como esta terra moldada nas ondulações enraivecidas do vento invernoso, mas emoldurada na memória da brisa cálida das Primaveras que se sucedem. Fomos conhecer as costas do Alentejo, muitas vezes esquecidas, outras tantas simplesmenete abandonadas, mas cada vez mais visitadas e traçamos-lhe um roteiro da outra face de um Alentejo que nunca é grande de mais para ser descoberto.

Texto e Fotos
Pedro Cativelos


Secularmente estas são terras de camponeses, pescadores e apanhadores de marisco… Agora, chegam turistas, curiosos visitantes, foragidos ao stress, surfistas… Mas a vida segue. Impávida, serena, como se quer. Os Alentejanos do Sudoeste, habitantes da Costa Vicentina convidativa ao descanso nos campos forrados de flores até às falésias, a pique sobre o mar em revolta sabem, mesmo sem darem por isso que, por aqui, o “Algarve” ainda está muito longe, e as mega-urbanizações e as auto-estradas são ainda projectos que não passaram do plano de papel. Estão degradados, a maioria dos acessos que conduzem a praias onde por enquanto ainda só é possível chegar de jipe, ou com muito espírito aventureiro, por entre cabeços cobertos de estevas agressivas. Mas a cada praia, mais ou menos recôndita que se avista, a sensação é impressionante e o ar, carregado de iodo, chega a arder quando se respira fundo. Cheira a descoberta, cheira a liberdade.

Beleza sem fim
Praias, dunas, falésias, charnecas, estuários e vales fluviais são alguns dos habitats onde vivem plantas e animais que constituem património natural desta região. É o caso de algumas espécies de plantas, como a Silene Rothmaleri e a Plantago Almogravensis, que tinham já sido consideradas extintas quando, nos anos 90, foram encontradas pequenas populações de ambas as espécies. Existem ainda as quase desconhecidas famílias de lontras que se estabeleceram nesta costa rochosa. Estes e outros motivos são mais do que suficientes para que zonas como o estuário da Carrapateira e a Praia do Castelejo, por exemplo, sejam visitadas por botânicos e zoólogos provenientes de todo o mundo.
A paisagem é alta e escarpada escondendo minúsculas praias abrigadas por entre as arribas esculpidas. Há momentos, de maré vazia, em que o mar se retira e faz descobrir uma areia plana onde a água se revela inspiradora para um belo mergulho de Verão.
No Sudoeste Alentejano, o tempo consolidou e modelou as encostas areníticas, ora rosa, ora ocre, ora encarniçadas... Cores com vida, num bem preenchido mapa dos sentidos, onde sobressaem os aromas do campo, das ervas de cheiro que por aqui servem de tempero e conserva aos frutos do mar. Se o Alentejo vive ao sabor da terra, deve acrescentar-se que também sabe sobreviver à sombra do Atlântico.

Tróia, Comporta, Melides… sempre à beira mar
Do Estuário do Sado pode observar-se uma grande diversidade de elementos naturais, que produzem uma paisagem verdadeiramente única. Começa aqui o Alentejo, apresentando-se hoje como um dos melhores exemplos de um litoral ainda pouco intervencionado, mantendo praticamente em toda a sua extensão a maioria das suas características naturais.
Entre o Oceano Atlântico e a planície alentejana, numa extensão de 45 km, desde o extremo da península de Tróia até à praia de Melides, a costa do concelho de Grândola, é a maior extensão de praia do país, uma mancha contínua de areal que se perde na vista do horizonte. Ainda antes, os martelos pneumáticos ocultam o ruído das gaivotas que pairam sobre as ondas, enevoadas pelo pó que anda no ar. Tróia está a mudar… e a crescer com o turismo.
Poucos quilómetros à frente, a praia da Comporta, que deve o seu nome ao sistema de canais de irrigação do vale de arrozais que se estende até ao Carvalhal. Situado no extremo sul da Península de Tróia, o seu enorme areal é chamariz para muitos veraneantes de ocasião.
Estando nos limites da Reserva Natural do Estuário do Sado, esta praia é um espaço natural preservado, onde se conserva a vegetação dunar original, rodeada por abundância de pinhal. Seguindo para Sul, Melides, onde a história falada relembra o naufrágio de Fernão Mendes Pinto, provocado por corsários franceses em busca de fama e fortuna. Naquela enseada terá conseguido a protecção de que necessitava… Hoje, por lá param mais de duas centenas de espécies de aves identificadas e protegidas, como o pato de bico amarelo, o galeirão de crista e a águia pesqueira.



S. Torpes e S. Tropez…
Mais a Sul, S. Torpes é a primeira praia que se nos depara após o complexo industrial de Sines marcando igualmente o início do Parque Natural do Sudoeste Alentejano e a Costa Vicentina. Este extenso areal, encontrou o seu baptismo no destino da cabeça de um oficial romano morto por Nero, chamado Torpes, que por aqui, há muito, muito tempo terá dado à costa. O resto do corpo aportou em Saint Tropez (estância balnear no Sul de França), bem longe daqui, mas para sempre próxima. Pelo nome e pela histórica rocambolesca. Porventura para o livrarem do peso do castigo e do nome colocaram-lhe, tanto aqui, como em França, o São, para assim repousar, em eterno descanso.
Para trás, Sines, a mais industrializada localidade do Alentejo, com o seu Porto de abrigo a romper as águas até bem longe da costa e a gigantesca central termo-eléctrica de S. Torpes a descaracterizar a paisagem. O dourado da areia, mistura-se com a escuridão da fuligem libertada pelos muitos navios que ali passam e pelos fluidos escoados pela Central. Metros à frente, e se não olharmos o retrovisor, o cenário volta a ser edílico.
Para lá da lenda, e da crua realidade, ali começa a estrada alcatroada que, sobre dunas e falésias conduz até Porto Covo. A vista é única. O recorte da costa deixa mostrar as inúmeras baías de onde sobressaem as praias de Morgavel, da Oliveirinha, e as arribas da Samouqueira. Apetece mergulhar.




Aqui, no lugar de Porto Covo…
Hoje, a velha vila de pescadores que um dia Rui Veloso imortalizou em cantiga, já se estende para Norte, enchendo-se de pequenos aglomerados de casas muito recentes, geminadas, mas sem a traça das que permanecem no centro. Vale a pena ir até à praça Marquês de Pombal, setecentista, quadrangular à maneira das praças pombalinas. Tem uma igreja e fiadas de casinhas de uma porta e uma janela e barra azul, antigas casas de pescadores, transformadas em restaurantes, bares, artesanatos, cafés. Integrada no Parque Natural do Sudoeste Alentejano e com o mar como cenário de fundo, Porto Covo é ainda uma pequena vila piscatória que se desenvolveu bastante nas últimas décadas. Mesmo junto à aldeia, a Praia Grande tem as características de uma praia urbana, com bons acessos e infra-estruturas de apoio. Rodeada de grandes rochedos que a tornam mais abrigada, é banhada por um mar de águas límpidas que, por vezes, tem uma ondulação forte apreciada, bastante pelos surfistas.
Ali bem à vista, a Ilha do Pessegueiro, para sul, com as suas falésias mais bem delineadas, com a praia em forma de concha a mirar a Ilha. Para lá se pode nadar ou navegar. Nela jazem os restos de um forte do tempo dos Filipes e o forte do Pessegueiro, do século XVI. A caminho de Vila Nova de Milfontes, as praias de Aivados e do Malhão estendem-se ao longo de sete quilómetros, cheios de recantos alheios à civilização popular.




Vila Nova de Milfontes
A costa começa a elevar-se a partir de Porto Covo e as falésias chegam até ao Cabo de S. Vicente. São 26 quilómetros de falésias que chegam a ter 45 metros de altura no Cabo Sardão, enraizadas nos verdejantes pinhais, que tão bem se familiarizam com os solos arenosos e com a brisa do mar. No centro de tudo isto a Vila Nova das Milfontes é apenas surpresa para quem já não a conhece. Sobretudo se se fizer a aproximação pela estrada que passa pelo Cercal. Vila Nova, no estuário do rio Mira, alva e caiada para o turismo de Verão, sempre cuidada. Na marginal, sobressaem os largos milhares de pessoas, acompanhadas pelas demasiadas centenas de carros que viajaram de todo o país para aqui repousar por uns dias. Ao lado de uma fila de trânsito e de uma outra para o Multibanco, a muralha do velho forte, construído em 1620, como está escrito no chão, na pedra da calçada. A água é fria, é de rio. Mas do outro lado, na curva do estuário as ondas já são salgadas pelo mar Atlântico. Apesar das muitas gentes que aqui vêm todos os anos, sente-se aqui Alentejo ainda. Basta levantar o olhar e reparar na outra margem do Mira. Fala-se numa mega urbanização que Luís Figo anda a tentar aí construir mas para já… Praias desertas, vegetação impenetrável, verdadeiro hino à Natureza…




Almograve
Para lá do rio, o areal estende-se por mais alguns quilómetros até Almograve, um dos mais bonitos percursos dunares que se pode observar… Por ali, as ondas são de mar e de areia esculpida pelo vento. A vegetação prende as suas raízes para escapar à fúria devastadora da hora de almoço de uma… manada de vacas que dali faz pasto e repasto.
As dunas alongam-se, com as suas encostas de areia avermelhada, ferruginosa até à Zambujeira, passando pelo Cabo Sardão, outro local que ainda conserva a essência do Alentejo litoral. A praia, rochosa, mas com bastante espaço para o mergulho livre de adultos e crianças, tem uma cor azul, especial, retemperadora, serena, acolhedora.
Zambujeira do Mar, um festival, a sudoeste…
Integrada no Parque Natural da Costa Vicentina e Sudoeste Alentejano, a Praia da Zambujeira do Mar está rodeada por falésias altas, de onde se pode apreciar um deslumbrante panorama sobre o Atlântico. Banhada por um mar de ondulação forte, com boas condições para a prática de surf e bodyboard, a praia está situada junto a uma povoação que se viu lançada na fama com o festival Sudoeste. Todos os anos milhares de jovens a visitam na primeira semana de Agosto, transformando-a numa espécie de Woodstock perdido no tempo e no sentido. Há papéis nas janelas. “Alugam-se quartos, chambres, zimmers…”. Para quem não quer acampar e tem dinheiro vivo no bolso, porque aqui, os preços disparam durante uma semana em cada ano. Depois, bem, regressa a tranquilidade.

Amália na praia e Odeceixe…
Já perto da fronteira com o Algarve, descobre-se, a praia da Amália, precisamente, o local onde passava largas temporadas e onde ainda existe a casa de Amália Rodrigues. Fazia-lhe bem o mar, costumava dizer, aquele pequeno sitio, de pescadores a navegar ao longe, em pequenos botes de madeira azul e branca com nome de mulher, numa estranha forma de vida, sem destino e com saudade. Antes, chamavam-na a praia dos girassóis… Faz sentido, porque também o sol é uma estrela que nunca deixa de iluminar.
A praia de Odeceixe é aqui tão perto. A terra é seca, e curta na distância que separa as duas margens da Ribeira de Seixe, a linha geográfica que separa as duas regiões.
O Alentejo está perto do fim. Pelo menos por aqui. Mas há ainda tanto por descobrir, tem de haver, pressente-se, por entre as lágrimas das ondas que se despenham de encontro à rocha milenar, no voar das garças do final de tarde, no corrupio das gaivotas perseguindo os homens que regressam da faina, no estrépito das folhas de pinheiros enleados pela agitação provocada pela mudança das marés. Tanto para perceber ainda nos sorrisos que se recebem com simplicidade, cúmplices deste território que ainda é tão selvagem e simultaneamente, tão humano.


Onde Dormir

Herdade da Matinha, Cercal do Alentejo, tel.: 962 944 285 (www.herdadedamatinha.com). Um monte alentejano com quatro quartos com cama de casal e cama extra. Em época alta, este turismo rural funciona em regime de meia-pensão, com pequeno-almoço com pão cozido em forno de lenha e jantares gourmet, usando só produtos da região e da horta biológica da herdade. Duplos a partir de € 70, em época baixa, e € 90, em época alta. Fica entre Odemira e Vila Nova de Milfontes.

Herdade Monte Velho, na estrada que vai da Carrapateira para Vila de Bispo. Reservas pelo tel.: 282 973 207/ 966 007 950 ou Fax: 217 938 086; www.montevelhoresort.com. Hotel rural com sete suites e dois quartos duplos, todas elas com decoração personalizada. Charmoso e com muito bom gosto. Preços a partir de € 90 em regime de APA, neste preço estão incluídos, passeios de BTT e de burro.

Monte do Papa-Léguas, Zambujeira do Mar, tel.: 283 961 470; www.montedopapaleguas.com; montedopapa@sapo.pt. Um monte tradicional alentejano, acolhedor, numa propriedade com cinco mil hectares, dentro do Parque Natural. Organiza vários tipos de percursos, passeios a cavalo, de BTT, a pé ou de canoa. Possui 5 quartos duplos. Preços a partir de € 52,38. Os preços de equitação rondam os € 22,45 por hora, a canoagem inclui 6 horas de viagem com almoço à beira-rio e visita às cascatas, este passeio custa cerca de € 30 por pessoa (mínimo 6 participantes).

Corte Pero Jaques, em Aljezur, tel.: 282 687 893/966 318 436; www.corteperojaques.pt. Turismo rural no alto de um monte em Espinhaço de Cão. Possui uma casa independente com nove quartos duplos, sala e cozinha, Preços a partir de € 109,74. Fazem também passeios de jipe na zona com prova de vinhos e jantar por € 29,93/pessoa.

Quinta de Pêro Vicente, a cerca de três quilómetros de Regil, entre Odeceixe e Aljezur. Tel.: 282 995 192; www.terrasdemouros.pt; E-mail: geral@terrasdemouros.pt. É constituído por três quartos duplos a partir de € 65, em regime de APA, tem também actividades artesanais, passeios de natureza, BTT, pesca desportiva, férias infantis.


Onde comer

Trinca Espinhas, Praia de S. Torpes, Sines, tel.: 269 636 379. Um restaurante de praia com esplanada muito agradável e decoração a condizer, oferece uma ementa constituída por sandes, saladas, hambúrgueres, cachorros, pregos no pão, tostas e petiscos como camarões fritos no alho, ostras, amêijoas, mexilhões, massinha do mar, picanha, conquilhas e uma cataplana à Trinca Espinhas. O preço de refeição custa cerca de € 17,46. Aberto das 12h às 00h.

O Sacas, Zambujeira do Mar, tel.: 283 961 151. Fica no porto de pesca. Especialidade: feijoada de búzios, chocos. O horário de abertura é das 8h às 2h da manhã. O preço por refeição ronda os € 17,46.

O Sítio do Forno, Situa-se na Praia do Amado, Carrapateira, tel.: 966 567 825/ 963 558 404. A especialidade da casa é peixe fresco grelhado, está aberto das 12h às 22h. Preço médio de refeição: € 15.



Parque Natural do Sudoeste Alentejano e Costa Vicentina
Estendendo-se ao longo de mais de 100 quilómetros de costa, desde Porto Covo no Alentejo, até ao Burgau no Algarve, o Parque Natural do Sudoeste Alentejano e Costa Vicentina é o troço de litoral europeu melhor conservado, com várias espécies de fauna e flora únicas, sendo por isso visitado por muitos zoólogos e botânicos, oriundos de todas as partes do mundo.
O Parque Natural do Sudoeste Alentejano e Costa Vicentina estende- -se por toda a zona litoral compreendida entre S. Torpes e o Burgau. Abrange uma área com aproximadamente 70 mil hectares, expandindo-se por uma mancha de mar aberto com dois quilómetros de largura paralela à costa. Com um importantíssimo património do ponto de vista geológico, como da flora e fauna, possui cerca de 200 espécies de aves referenciadas (como é o caso da Águia Pesqueira, da Águia Bonelli, da Cegonha-Branca, Gralha-de-Bico-Vermelho e Falcão-Peregrino), 750 plantas, 48 das quais que apenas existem em Portugal e importantes colónias de raposas, ginetos, gatos-bravos e lontras.

Agosto de 2007,
Diário do Sul

“O meu mundo ainda não acabou”




Ruy de Carvalho, tem 60 anos de palco, outros tantos de casamento, mais alguns de idade, e muitos outros de experiências e sensações que dariam para preencher várias outras vidas, cheias, plenas… Contracenou com os maiores do teatro português, como Laura Alves, João Villaret ou Eunice Muñoz. Deu corpo às palavras dos melhores escritores e dramaturgos e emprestou a sua figura e voz à película de muitos filmes.
Para lá de carreira que já esgotou todos os prémios, sobram as memórias de toda uma vida, ainda a ser vivida, intensa, incessante como as pancadas de Moliére que lhe pautaram o destino e o trouxeram, emoção após emoção, até nós.

Por,
Pedro Cativelos

Foto,
Patrícia Moreira


Como é o seu dia a dia?
Normalmente, deito-me às 4 da manhã. Às vezes tenho muito sono. Tenho que estudar, tenho que preparar o trabalho para o dia seguinte e deito-me tarde. Se posso dormir um pouquinho de manhã, durmo, senão levanto-me. Não tenho nada contra o trabalho e gosto de estar sempre pontualmente nas coisas.

Ainda fuma?
Não tive nada, deixei de fumar. Não tinha realmente grande prazer engolir o fumo, era um prazer de mãos, talvez…. Na minha vida profissional de vez em quando acontece, acontece o cachimbo, acontece o charuto, acontece muita coisa, mas…

É conhecido o seu carinho pelos animais… A sua cadela tem observado atentamente a nossa conversa…
Sempre tive animais. Gosto de cavalos, leões, os tigres, logo que me respeitem… Há animais que tenho mais respeito, mas tenho interesse em saber como é que vivem, como é que andam pelo mundo. Porque vivi em Angola, passei a minha infância e adolescência muito próximo da Natureza.

É português de berço, mas cidadão do mundo, pela Viagem…
Nasci abaixo do Castelo de S. Jorge em 1927 e fui para África com 2 anos por causa do meu pai, mas depois vivi no Norte, em Évora, em tantos sítios.

Sempre viajou muito…
Devido à vida profissional do meu pai éramos todos obrigados a muitas movimentações. Tinha que mudar, como o carrossel do exército, portanto ele mudava e eu também mudava! Mudava de escola, de amigos (por isso arranjei amigos em toda a parte)… Tenho sempre saudades daquele mundo em que vivi.





Foi e é amigo de grandes personalidades da cultura portuguesa…
Por exemplo, na Covilhã, tive um companheiro de carteira que vocês conhecem e que eu muito estimo, o Alçada Baptista. É uma grande honra para mim ter um colega destes não é?! Por esta altura o meu pai passou à reserva e mudámos para Lisboa que é a minha terra de nascença. Nasci logo ali, por debaixo do Castelo de S. Jorge, já lá vão 80 anos!


Quando vê os Óscares não tem pena de não ter emigrado?
Talvez sim… mas acho que nunca o faria! Acredito que é cá que tenho de cumprir a minha missão.

O Portugal pós-revolucionário é ainda um sonho por concretizar?
Há situações que me entristecem… A nossa tão bela revolução não estar totalmente concluída. O povo nunca chegou a senhor quem mais ordena… Não ordena nada! Mas este é um país que eu adoro! Cada vez que vou lá fora gosto mais da minha terra, só que… às vezes não sabemos aproveitar o que temos, a beleza natural, a arquitectura, até as pessoas! O que me entristece é que muitas vezes não saibamos amar o Pais como ele é e que não consigamos ou queiramos cumprir plenamente perante o mundo o nosso papel social e histórico.

Por falar em Revolução, onde é que estava no 25 de Abril?
Olhe, estava numa garagem com uma avaria no cano de escape do carro e tinha de ir para fora filmar um realizador com o já falecido Manuel Guimarães. Estava de caminho para a Serra da Estrela, mas acabei por não ir! Felizmente! E depois fui confirmar porque estava tudo eufórico, era a revolução dizia-se na rua e já não houve trabalho para ninguém.

Pensa muito sobre o verdadeiro sentido da vida?
Não sei se viverei muitos mais anos, vamos lá ver…

Então?
Não tenho tempo para pensar nessas coisas!

O que lhe dá mais prazer?
O meu trabalho, a minha família, a minha música…

E no pouco tempo que não está a trabalhar, esse pensamento invade-o?
Mesmo quando não trabalho, tenho muita coisa para fazer, gosto de ler, de viajar, de ser um cidadão vivo, não adormecido.

Ainda trabalha muito, não está cansado?
Gosto de ter alguma comodidade, por isso trabalho muito! Acho que todos deveriam ter essa comodidade mas precisava de ter uma reforma melhor para não trabalhar tanto, mas como me deram uma reforma “caca” eu tenho que trabalhar mesmo! Tenho despesas que me obrigam, como a doença da minha mulher, a casa…

Só com a reforma era difícil…
Se eu tivesse só a reforma, morria vestido… Vestido e com pouca roupa!
Já estou reformado, desde os 65 anos, por isso é que eu digo que tenho uma reforma que não presta porque não me dá para fazer todas as coisas de que realmente gosto!


Ainda tem muitos sonhos por concretizar?
Acho que o homem que deixa de sonhar, deixa de viver, não é verdade? É preciso sonhar sempre, quando um homem sonha o mundo pula e avança, portanto o meu mundo ainda não acabou! Entretanto vou vivendo a vida, vivendo o mais possível, com intensidade, com algum prazer, com alguns desgostos, mas vivo, com as coisas de que me rodeio e de que mais gosto.

Junho de 2007,